Sistemas agroflorestais fortalecem a resiliência hídrica frente às mudanças climáticas
- Consorcio Cerrado das Águas
- 11 de ago.
- 54 min de leitura
Conhecimento científico e práticas no campo impulsionam a sustentabilidade da cafeicultura

Curso Sistemas agroflorestais e seu potencial de aumentar a resiliência hídrica frente às mudanças climáticas.
Data 29/04, 08:00 – 13:00
Local: Fazenda Três Meninas, município de Monte Carmelo
Palestrante: Pesquisador do Centro Agronómico Tropical de Investigación y Enseñanza - CATIE, Costa Rica, Elias de Melo Virginio Filho, possui experiência na área de Desenvolvimento Rural e Sistemas Agroflorestais, atuando nos temas de: Vulnerabilidade e Capacidade Adaptativa frente Mudanças Climáticas.

No dia 29 de abril, a Fazenda Três Meninas, em Monte Carmelo (MG), recebeu o curso “Sistemas agroflorestais e seu potencial de aumentar a resiliência hídrica frente às mudanças climáticas”. Conduzida pelo pesquisador Elias de Melo Virginio Filho, do Centro Agronómico Tropical de Investigación y Enseñanza (CATIE), na Costa Rica, a capacitação reuniu produtores e técnicos para apresentar estratégias baseadas em ciência e experiências práticas que conectam conservação ambiental e alta produtividade na cafeicultura.
Durante sua apresentação, o Palestrante Elias de Melo Virginio Filho ele destacou pontos como:
Papel das árvores na infiltração de água e no controle do microclima
Redução da perda de umidade no solo e mitigação de extremos climáticos
Benefícios da arborização para controle biológico de pragas e doenças
Potencial dos sistemas agroflorestais para manter produtividade e qualidade
Integração de espécies frutíferas, madeiráveis e leguminosas para otimizar a sustentabilidade
As experiências e evidências científicas compartilhadas mostram que a transição para modelos produtivos arborizados, com menor uso de insumos químicos, pode gerar ganhos ambientais, sociais e econômicos para os produtores.
Acompanhe a transcrição completa da palestra e conheça os detalhes dessa abordagem inovadora. Se preferir, você também pode ouvir o conteúdo completo no Spotify.
Agora, confira os insights valiosos que podem transformar sua forma de manejar a cafeicultura de maneira sustentável e resiliente!
Transcrição
Muito bom dia!
Um prazer enorme estar aqui com vocês. Um prazer enorme, eu sou o Elias Virginio de Melo Filho, sou uma mistura nordestina entre Pernambuco, Paraíba e Ceará. Sou Engenheiro Florestal, formado Universidade Tiradentes e natural da Paraíba.
Tive a oportunidade de buscar uma formação em um lugar que fosse referência em uso sustentável dos recursos naturais em áreas produtivas. Na época em que eu terminei o meu curso, o Brasil não tinha ainda opções nesse sentido, eu fui parar na Costa Rica para atender esse sonho de trazer informação relevante para os desafios brasileiros.
Depois que terminei o meu mestrado, o sonho era voltar ao Brasil e estabelecer programas de pesquisa, cooperação técnica, vinculado aos temas relevantes que a gente considerava naquela época. Estamos falando início dos 90. Estive quatro anos trabalhando em duas universidades, a Universidade Federal da Paraíba e a Universidade Rural do Pernambuco, mas o contexto que a gente estava inserido não permitia a gente avançar no que a gente vinha trazendo, que a gente vinha conhecendo de um país que tomou uma decisão histórica.
Eu cheguei justamente para fazer o meu mestrado nos anos 80 e a Costa Rica estava discutindo de ponta a ponta qual era o futuro do país na proposta de desmatamento massivo, na proposta de expansão produtiva indiscriminada. E presenciei um país inteiro discutindo como mudar a realidade do manejo dos recursos naturais e, evidentemente, a decisão país foi de entender que a agricultura, que a economia deveria reconhecer e que produzir deveria ser feito em harmonia com esse patrimônio.
Então, a ciência, as organizações produtivas, as empresas se matricularam com a proposta país e, resultado, a Costa Rica hoje é cenário importante a nível mundial como referência de um país que saiu de 23% de cobertura florestal para 60%. Nos anos 80, para cá, a política foi tão agressiva e o pacto nacional foi tão forte que se reverte a tendência de desmatamento.
Aproveitando a oportunidade de ouro, de retomar o meu sonho no Brasil, muito obrigado, Consórcio Cerrado das Águas, Marcelo, muito obrigado. Quer dizer, eu tenho a oportunidade de ouro estar com vocês num momento único porque se a gente não toma a decisão transcendental de nossa vida nesse momento, nós vamos realmente lamentar a curto prazo.
E venho trazendo para vocês uma síntese do que a gente vem trabalhando nos últimos 25 anos associada a essas estratégias de encontrar alternativas que demonstrem que esse ativamento nós criamos contradição entre conservar e produzir porque a gente não usava bem a nossa capacidade de análise porque a natureza está programada para colaborar com a produção. E a pesquisa que a gente tem feito de longo prazo, esses 25 anos, eu tenho o privilégio de estar numa rede que trabalha 40 pesquisadores estudando todas as interações possíveis para fazer viável essa produção harmônica com a natureza. Então estar ali e ver todas as janelas desse castelo porque cada pesquisador maneja uma área, tem uma área de interesse e a gente vem aprendendo sobre coisas que a gente nem imaginava na vida.
Esse trabalho dessa rede agroflorestal científica é a maior rede de científicos agroflorestais da América e a gente vem com várias instituições internacionais trabalhando com empresas que nos últimos tempos entenderam que não haverá mais uma economia viável sem o apoio da ciência construindo novos modelos produtivos.
Então a minha universidade na Costa Rica ela tem a sede lá porque o país é uma referência, é a sede principal, mas ela trabalha em toda a América Central, na América do Sul, no Caribe e fazemos impulsões para outros continentes, mas o foco é a América Latina e a gente está tendo a oportunidade então de dispor em uma base de dados de investigação de mais de 80 anos.
Os primeiros professores da UFV dos cursos que foram estabelecidos aqui foram fazer mestrado lá na universidade e a universidade realmente é uma referência importante que vem trabalhando com validações de campo com produtores. Nós fazemos pesquisa fechada na universidade, a gente tem uma rede, eu particularmente tenho trabalhado com uma rede de 1350 propriedades que representa pequenos laboratórios dentro dos territórios como o Marcelo passa a integrar essa lista também. Então essas propriedades elas são centenelas, elas estão sendo o espaço onde a gente aterriza o conhecimento científico.
Me surpreendeu que, em 2022, a Havou Café — uma das maiores empresas comercializadoras de café, que já conhecia o nosso trabalho — entrou em contato e disse: 'Professor, chegou a hora.' Eu perguntei: 'A hora de quê?' E eles responderam: 'A hora que o senhor sempre falou. Vamos embarcar para visitar seis países. Queremos ver se o senhor chega até a África também. Mas uma coisa já entendemos: não haverá produção de café se não repensarmos o modelo de produção.
Então, Marcelo, o negócio do café ainda não chegou ao fim. Pelo contrário, o setor está em busca de alternativas para transformar seus modos de produção. E isso por uma razão muito simples: o café é, e continuará sendo, a commodity que mais gera riqueza na Bolsa de Nova Iorque. Simples assim.
O mais impressionante é que até quem antes ignorava a gravidade da situação já entendeu: o verdadeiro negócio, agora, é resgatar a natureza para salvar o próprio café. Nesse contexto, a aproximação em 2023 com o programa Cerrado das Águas se revelou uma oportunidade de ouro para compreendermos um drama que é, de fato, transcendental.
Até mesmo os mais religiosos se surpreenderam quando o Papa Francisco afirmou que a principal crise humanitária associada à questão ambiental é a mudança climática. Muitos acharam que ele estava apenas sendo simbólico, mas não: o Papa estava embasado em evidências científicas robustas, que apontam que o planeta atravessa uma transformação radical das condições naturais. Gelo derretendo, comunidades inteiras sendo forçadas a se deslocar, tudo isso é real.
E é importante lembrar: a faixa tropical, onde o Brasil está inserido, é justamente a zona de maior impacto. A mudança climática atinge o mundo inteiro, mas os efeitos mais negativos estão se concentrando aqui, na região tropical. Vocês estão diretamente no centro dessa região. E uma coisa impressionante, toda a produção do café está nessa região. Então isso quer dizer que as empresas que estão fazendo o negócio do café já entenderam que não vão poder pensar em consolidar a estabilidade do negócio se não resolverem modelos que permitam se adaptar a essa mudança climática.
A nossa universidade, e o meu trabalho em particular com essa rede de 1.350 propriedades, tem como objetivo monitorar todas as variáveis que indicam o quanto estamos, pouco, moderadamente ou intensamente, expostos às mudanças climáticas. E a realidade é clara: Guatemala, Costa Rica, Nicarágua, Honduras e, infelizmente, o Brasil também, já não possuem mais a temperatura que o café exige como requerimento natural para sua produção.
As condições agroecológicas que aprendemos nos livros, temperatura ideal, precipitação adequada, tipo de solo, regime hídrico deixaram de existir. Washington, quando estudamos climatologia, aprendemos que havia uma "zona de conforto" para o café. Pois bem: rasguem os livros! Essas referências já não servem mais. Não se pode mais garantir uma temperatura máxima de 25 °C, nem uma estabilidade nos regimes de chuva. As médias climáticas mudaram, e o que vemos é um cenário de irregularidade: secas intensas, geadas inesperadas, tempestades severas e alterações no período de floração. Um desequilíbrio total, documentado em todas as regiões produtoras de café.
E no Brasil, esse desequilíbrio é ainda mais preocupante. Somos, hoje, o país com maior vulnerabilidade às mudanças climáticas no setor cafeeiro. Os dados que mostrei anteriormente referem-se a países que, apesar dos desafios, mantêm alguma arborização nos cafezais — muitas vezes mal manejada, é verdade —, mas que ainda garantem certa resiliência agroclimática.
No Brasil, a situação é crítica: temos cerca de dois milhões de hectares de café plantados, e a maioria está a pleno sol. Sem sombra, sem amortecimento térmico, sem resiliência. Esse é o drama que estamos vivendo. E ele já havia sido alertado lá atrás. Em 2004, pesquisadores da Embrapa e da Unicamp já mostravam isso com clareza. Em Minas Gerais, vocês se lembram desse gráfico? O famoso 'striptease do café'. Talvez nem todos conheçam, mas ele mostra exatamente a perda gradual das áreas ótimas para o cultivo de café no estado.
Na época, foram feitas projeções com diferentes cenários de aumento de temperatura: 1°C, 3°C, até 5,8°C. E o que se viu foi assustador, quanto maior a temperatura, menor a área viável para o cultivo de café. Em síntese, estamos perdendo território produtivo. E essa é uma realidade que precisa ser enfrentada com urgência.
Confirmando o que já se dizia em 2004, estamos caminhando para um cenário em que não haverá mais café arábica em Minas Gerais, diante do contínuo aumento da temperatura no estado. E como diz o ditado: 'Em guerra avisada não se perde soldado.' O programa Cerrado das Águas está enxergando isso com clareza. O aumento da temperatura é real, e com ele vem a redução das áreas ótimas para o cultivo do café. É um fato. E precisamos reagir.
Em 2004, recebemos o alerta. Dez anos depois, em 2014, os mineiros se surpreenderam com os dados: entre 1981 e 2010, janeiro apresentava temperaturas adequadas ao cultivo do café. Mas em janeiro de 2014, registraram-se temperaturas acima de 32°C em várias regiões, um valor jamais observado antes. O impacto foi devastador. Fevereiro repetiu o padrão: muito acima da média histórica. O resultado? Grãos deformados, vazios, os chamados "xoxos". 2014 foi um marco.
Esse cenário ilustra perfeitamente o que significa cultivar café a pleno sol, exposto a extremos térmicos. Um estudo de 2007, projetando os impactos das mudanças climáticas no Brasil, já alertava sobre o aumento da incidência do bicho-mineiro. Quanto maior a temperatura, mais o inseto se reproduz. O calor favorece sua multiplicação, encurtando os ciclos reprodutivos. O mapa de 2007 já mostrava áreas críticas. A previsão para 2050 apontava um agravamento. E para 2080, o cenário é dramático: mais ciclos, mais infestações, mais prejuízo.
Ironicamente, o bicho-mineiro virou um indicador biológico da mudança climática. E isso foi recentemente confirmado. Uma publicação de março passado, do Centro de Comércio do Café de Minas Gerais, traz um alerta claro de pesquisadores: estamos nos aproximando de um ponto crítico.
Entre março e outubro de 2024, foram registrados mais de 200 dias sem chuva em diversas regiões cafeeiras. As temperaturas médias ficaram 15% acima da média histórica. E o problema não foi apenas a seca — foi o calor extremo associado, como nunca antes registrado. Isso afeta diretamente o desenvolvimento do grão, danifica os tecidos da planta, queima folhas e frutos.
Ou seja, aquele veranico que antes diminuía o tamanho do grão, mas ainda permitia a produção, hoje já não tem o mesmo efeito. Porque agora ele vem acompanhado de temperaturas elevadas que simplesmente impedem a formação adequada dos frutos. O cenário mudou. A crise é real. E não há mais espaço para negacionismo.
Em síntese, não há mais possibilidade de seguir com a produção de café a pleno sol. Por quê? Porque estamos enfrentando secas prolongadas, altas temperaturas e geadas. E o café exposto, sem sombreamento, está totalmente vulnerável a essas condições.
E aqui entra um ponto fundamental. Como já disse o Papa Francisco: 'Não adianta rezar se não fizermos a nossa parte.' Precisamos controlar o microclima. Precisamos ter domínio da água, da temperatura, da umidade. Sem essa gestão integrada e sem a colaboração da natureza, a produção de café se tornará inviável.
Antes mesmo de chegar ao Cerrado das Águas, a minha instituição, com base em pesquisa científica, já vinha atuando em várias regiões cafeeiras, promovendo a integração entre restauração de paisagens, reflorestamento e sistemas agroflorestais. Porque a estratégia não é única, é complementar. Quando combinamos florestas nativas, proteção de nascentes e cafezais arborizados, ativamos as forças da natureza a nosso favor. E assim conseguimos condições ideais de solo, umidade, biodiversidade e clima.
Sistemas agroflorestais, agrofloresta, agrossilvicultura, não são apenas arranjos bonitos de plantar. São resultado de uma ciência com mais de 50 anos de pesquisa. Existem cientistas no mundo todo aprofundando essa abordagem. Infelizmente, o Brasil ainda não fortaleceu suficientemente sua rede de pesquisadores e técnicos nessa área.
Por isso, nosso trabalho também tem sido compartilhar o melhor dessa ciência com os pesquisadores e produtores brasileiros, muitos dos quais se sentem isolados. E queremos dizer: vocês não estão sozinhos. Há uma rede global de conhecimento, validada e aplicada, que está ao lado de vocês.
Inclusive, essa visão já chegou às maiores esferas do setor. Vocês sabem quem é Vanúsia Nogueira? Ela é a primeira mulher a assumir a direção executiva da Organização Internacional do Café, depois de mais de 200 anos de história. Em um evento na América Central, ela surpreendeu a todos ao afirmar que o futuro do café no mundo depende de quatro estratégias:
Agricultura regenerativa;
Bioinsumos;
Sistemas agroflorestais;
Preço justo para o produtor.
Esses são os quatro pilares que o Regear está trazendo para o café. Quando ouvi isso, pensei: estamos totalmente alinhados.
Estamos falando de estratégias que já têm reconhecimento internacional, inclusive pela própria Organização Internacional do Café (OIC). E é importante lembrar: por muito tempo, muitos apaixonados pela natureza tentaram agir com boas intenções, mas sem o respaldo da ciência. O que temos hoje é diferente. Temos uma rede de propriedades, em diferentes contextos, mostrando na prática os pilares do sucesso.
Porque, sim, precisamos ser produtivos, precisamos ser rentáveis. Mas, acima de tudo, precisamos aprender a desenhar e manejar os sistemas produtivos para que a natureza seja nossa aliada e não uma barreira.
E para isso, precisamos cumprir certos critérios estratégicos. Então, quando vocês ouvirem falar em sistemas agroflorestais, em arborização de cultivos, não pensem que há um único modelo ou receita pronta. Existem múltiplas possibilidades diferentes grupos de combinações, arranjos, arquiteturas produtivas que devem ser adaptadas às condições específicas de cada região, solo, clima e cultura agrícola.
Esses modelos, estudados cientificamente, podem ser aplicados a qualquer tipo de cultivo ou atividade rural inclusive à pecuária. É isso que temos feito na nossa universidade: demonstrar que, seja na criação de gado, no abacaxi, na soja, no milho, na cana ou no café, é possível incorporar os benefícios das árvores na paisagem produtiva.
Claro, é necessário um bom trabalho de planejamento e desenho dos processos. Mas os ganhos são imensos. Esse quadro, por exemplo, sintetiza todos os benefícios que os sistemas agroflorestais oferecem: controle do clima e do microclima na propriedade, restauração da paisagem e do solo, redução de pragas e doenças, e melhorias significativas no ciclo da água tema que abordaremos mais adiante.
Na América Central, temos atuado intensamente. As áreas vermelhas, neste mapa, representam as regiões cafeeiras. Nesses territórios, trabalhamos para formar o Corredor Biológico Mesoamericano, onde o café arborizado é considerado uma cultura estratégica. Hoje, 95% das áreas de produção de café na região são arborizadas, contribuindo para conectar ecossistemas e gerar benefícios ambientais amplos.
Um dos estudos que realizamos foi sobre a produção de água para abastecimento humano nas áreas cafeeiras. Descobrimos que, em países como Guatemala, Honduras, El Salvador, Nicarágua, Costa Rica e Panamá, existiam 1.110 nascentes dentro de áreas de produção de café nascentes que alimentam sistemas de abastecimento para comunidades inteiras.
Mais impressionante ainda: essas nascentes sustentavam uma população de aproximadamente 1,4 milhão de pessoas. Gente que depende da água que nasce dentro de sistemas agroflorestais cafeeiros.
E aí vem a pergunta-chave: por que esse café estava produzindo água?
Nós comprovamos, por meio de estudos realizados em propriedades grandes, médias e pequenas, que a presença de árvores na paisagem faz toda a diferença na dinâmica da água. Quando chove e não há arborização, a água escorre pela superfície é a chamada escorrência superficial. Já quando a paisagem está arborizada, a água infiltra no solo.
A entrada do Marcelo pela estrada comprova isso na prática: onde não há árvores, a água corre pela superfície; onde há árvores, ela penetra no solo. Um exemplo emblemático vem da maior propriedade cafeeira da Costa Rica, onde constatamos que 91% da chuva se infiltrava no solo nas áreas arborizadas. Já nas áreas sem árvores, 90% da água escorria superficialmente.
Ou seja, árvores produzem água ou melhor, ajudam a levá-la ao que chamamos de 'rio subterrâneo': elas alimentam os lençóis freáticos e mantêm a umidade do solo. É por isso que o programa Cerrado das Águas apostou na arborização como estratégia para gerar água dentro das lavouras de café.
Esse experimento é único no mundo: são quase 10 hectares dedicados ao estudo de 20 sistemas na verdade, 18 tipos diferentes de arborização, mais dois sistemas testemunhas, que são os cafezais a pleno sol.
Essa plataforma conta com o envolvimento de mais de 30 universidades e tem gerado dados continuamente, todos os dias, há 25 anos. E mais: foi implantada numa área degradada. A partir da compreensão de como colaborar com a natureza, conseguimos estabelecer esses 18 sistemas arborizados, viabilizando a restauração do solo, o manejo da água e a recuperação da paisagem.
Mas o que foi que descobrimos, e que queremos que vocês também aprendam e apliquem em suas propriedades? Algo maravilhoso: os sistemas arborizados, especialmente aqueles com baixa ou nenhuma carga de insumos químicos, estimulam a atividade de microrganismos benéficos no solo especialmente bactérias que promovem uma fertilização natural.
É por isso que, cada vez mais, acredito que a natureza é o nosso canal direto de comunicação com a criação. As árvores favorecem a vida no solo. E essa vida microbiana é capaz de reduzir nossa dependência de fertilizantes externos. Encontramos, por exemplo, bactérias fixadoras de nitrogênio (que retiram o nitrogênio do ar e disponibilizam para as plantas), bactérias solubilizadoras de fósforo e potássio todos nutrientes essenciais ao café, agora sendo gerados naturalmente.
Esse é um dos maiores tesouros que os sistemas agroflorestais revelam: eles não apenas protegem a água e o solo, mas também nutrem a lavoura com base na inteligência da própria natureza.
Ficamos surpresos com um dado revelador: em alguns casos, encontramos aumentos discretos cerca de 11% nos teores de nutrientes no solo em geral. Mas, na região das raízes do café, os aumentos chegaram a impressionantes 158%. Isso nos mostra que, com um bom sistema arborizado, é possível potencializar significativamente a fertilização natural diretamente na zona mais crítica para a planta.
Outra descoberta importante foi o controle biológico de pragas e doenças estimulado pelas árvores. Sim, a presença de árvores pode favorecer o desenvolvimento de bactérias benéficas que atuam como agentes de controle natural. Isso é determinante.
E tem mais um segredo complementar: o manejo da copa das árvores, ou seja, a poda controlada. Quando realizamos a poda das copas sobre os cafezais, estamos, na prática, adicionando nutrientes diretamente ao sistema. E, nesse sentido, as leguminosas são verdadeiras bombas de nutrientes. Para vocês terem uma ideia:
· No caso dos ingás, cerca de 3% do peso da copa é composto por nitrogênio.
· Nas eritrinas conhecidas por muitos como mulungu esse número chega perto de 5%. Ou seja, quase 5% do peso verde da folha é nitrogênio.
As raízes dessas leguminosas já fazem a fixação biológica de nitrogênio. Mas, ao podar e incorporar essa biomassa no solo, estamos também adicionando nitrogênio, fósforo e potássio, naturalmente. Por isso, é fundamental considerar que algumas espécies florestais fazem maior aporte de nutrientes do que outras e o desenho agroflorestal deve priorizar essa característica.
E há ainda outra informação fantástica, fruto desses 25 anos de estudos: a acidez do solo. Seguramente vocês, em suas propriedades, já enfrentaram esse problema. Marcelo, por exemplo: como tem sido sua experiência com acidez? Tem precisado fazer muita correção?
Pois vejam: segundo dados recentes, coletados há apenas três semanas, 96% das propriedades cafeeiras da Costa Rica apresentaram níveis elevados de acidez do solo. E a ciência já demonstrou que a acidez tem impactos negativos importantes. Por quê? Porque, mesmo quando os nutrientes estão presentes no solo, eles não são assimilados de forma eficiente pelas raízes do café. Esse é o primeiro grande problema.
O segundo grande problema da acidez do solo é que ela o torna extremamente vulnerável a nematoides e a doenças fúngicas. Em outras palavras: solo ácido é sinônimo de maior risco sanitário. Além disso, como já vimos, ela limita a absorção de nutrientes pelas plantas.
Mas o que acidifica o solo? Uma das principais causas é o uso intensivo de nitrogênio químico-sintético na fertilização. Altas cargas desse insumo não apenas contaminam os cursos d’água, como também acidificam o solo. Por isso, na agricultura convencional, é comum a necessidade constante de correção da acidez com calcário.
No nosso experimento de 25 anos, avaliamos 20 sistemas de produção: 18 sistemas arborizados e 2 sistemas a pleno sol. Dentre eles, testamos inclusive sistemas com altas cargas químicas tanto arborizados quanto sem árvores. Por exemplo: o sistema AC (alta carga), com 300 kg de nitrogênio por hectare ao ano, aplicação de fungicidas, herbicidas, tudo o que se possa imaginar do pacote químico convencional.
E o que descobrimos? A primeira constatação foi alarmante: nos sistemas a pleno sol, mesmo após 21 anos de correções, a acidez do solo não apenas persistiu ela se agravou. Ou seja, apesar de todo o manejo químico, a condição do solo piorou com o tempo.
Depois, começamos a analisar os sistemas com o mesmo pacote químico, mas sob árvores. E aí vieram as surpresas. A primeira: nos sistemas arborizados com espécies madeiráveis, a necessidade de calagem, ou seja, de correção da acidez com calcário foi menor.
A segunda surpresa: nos sistemas arborizados com leguminosas, essa necessidade foi ainda mais reduzida. Árvores leguminosas contribuíram significativamente para equilibrar o pH do solo.
E a terceira, talvez mais importante: em todos os sistemas que utilizaram bioinsumos associados à arborização, conseguimos resolver o problema da acidez do solo. Em contrapartida, nos sistemas com aplicação contínua de insumos químicos sintéticos mesmo os arborizados o problema da acidez nunca foi solucionado.
A conclusão é clara: quando reduzimos a carga química e introduzimos árvores e bioinsumos, conseguimos restaurar o equilíbrio do solo. E isso não é teoria: é resultado prático, medido por 25 anos de pesquisa em campo.
Ao restaurar as condições do solo, ativei a biologia a meu favor. Ativei organismos do solo, como minhocas, que transformam matéria orgânica em nutrientes, e microrganismos benéficos que ajudam na fertilidade e na proteção das raízes. Com isso, comecei a regenerar aquilo que havia sido perdido por um manejo anterior que contrariava as leis da natureza.
A partir desses resultados, iniciamos uma nova etapa: estudar as 1.350 propriedades da nossa rede e seus vizinhos. Essa é, inclusive, a proposta que estamos desenvolvendo junto com o programa MAR e o Cerrado das Águas. A ideia era simples: estudar, por exemplo, o Marcelo e também seu vizinho. Aplicamos protocolos de avaliação e os resultados foram claros.
As propriedades que incorporavam árvores ao sistema produtivo, utilizavam variedades melhoradas, aplicavam práticas de conservação do solo e cuidavam da água protegendo e até mesmo produzindo água apresentavam os melhores resultados em termos de adaptação às mudanças climáticas. Já aquelas que não aplicavam essas práticas estavam claramente ficando para trás.
E isso não era apenas uma diferença entre regiões distantes. Eram propriedades que dividiam a mesma cerca. Isso mostra o impacto real e imediato da combinação de boas práticas. Um dado importantíssimo vem da maior fazenda de café da Costa Rica: lá, ao somar o impacto de todas as pragas e doenças, observou-se que a arborização adequada reduzia entre 10% e 20% os danos causados, sem comprometer a produtividade. Pelo contrário a produção se manteve alta. Isso confirma que um sistema bem desenhado, arborizado de forma estratégica, consegue manter produtividade e, ao mesmo tempo, promover o controle biológico.
E o que a pesquisa brasileira tem nos mostrado nesse sentido? Surpreendentemente (ou não), os dados estão em plena sintonia com os nossos achados. A Procafé que vocês conhecem como uma entidade de referência no setor publicou recentemente um boletim técnico, assinado por Matielo e Lucas, com uma informação que me chamou muito a atenção.
Eles relataram os resultados do cultivar Arara no Espírito Santo e na Zona da Mata de Minas Gerais, entre 900 e 1.100 metros de altitude. O que chamou a atenção foi o vigor e a alta produtividade observados justamente em sistemas com arborização. Eles ficaram impressionados com o desempenho do Arara sob sombra.
Descobrimos que existem plantas capazes de atrair, naturalmente, os controladores biológicos do bicho-mineiro e da broca duas das principais pragas que afetam o café.
O Marcelo, por exemplo, já tem contato com a Madeleine, que esteve aqui e vem monitorando essas interações. E é dentro desse processo que, ao longo de 25 anos estudando a ferrugem do café, tivemos uma surpresa inesperada.
Nos cafezais arborizados, começamos a observar uma mancha branca dentro da mancha amarela típica da ferrugem. Fomos investigar e encontramos três fungos parentes próximos entre si que atacam diretamente a ferrugem. Se olharmos bem, vemos o tamanho da lesão da ferrugem e a quantidade desse fungo branco sobre ela. Será que podemos afirmar que mais de 60% da lesão estava tomada pelo fungo? Analisamos, e sim trata-se de um fungo que literalmente 'come' a ferrugem.
Mas a surpresa não parou aí. Encontramos também uma larva minúscula, que se alimenta da ferrugem. Ampliamos a imagem e tem até um vídeo no YouTube e ela parece uma pequena máquina de guerra, combatendo a ferrugem com precisão. Ou seja, identificamos dois organismos naturais controlando a ferrugem.
E o mais impressionante: eles não aparecem em sistemas a pleno sol. Apenas em cafezais arborizados. É mais uma mensagem clara da natureza: 'Eu posso te ajudar, mas você precisa fazer sua parte.'
Por isso, é fundamental destacar: não se trata apenas de arborizar, mas de saber manejar essa arborização com equilíbrio. O excesso de sombra e de umidade também pode ser prejudicial. O ideal é uma arborização que permita o controle do microclima no cafezal. E é exatamente nessa direção que estamos avançando com o programa Cerrado das Águas.
Aliás, quero destacar o trabalho de um grupo da nossa rede de pesquisadores, um grupo, aliás, majoritariamente formado por mulheres, que vem estudando a presença de aves, polinizadores e abelhas em sistemas arborizados. E, mais uma vez, os resultados foram surpreendentes.
Elas documentaram, por exemplo, a presença de um grupo de aves chamado reinitas, muito comum na América Central. Essas aves só ocorrem em lavouras arborizadas e atuam como controladoras naturais da broca-do-café, alimentando-se da praga e contribuindo com o controle biológico.
Mas atenção: se não houver café arborizado, essas aves não aparecem. Ou seja, a estratégia de arborização é fundamental. E não para por aí. Elas descobriram também que existem aves que auxiliam, junto às abelhas, na polinização do café.
Durante muito tempo se afirmou que o café arábica não precisava de polinizadores, porque sua flor possui órgãos masculinos e femininos. No entanto, em um estudo realizado com isolamento de plantas por malhas especiais impedindo o acesso de aves e abelhas foi possível comparar os resultados com plantas vizinhas expostas aos polinizadores. O resultado? Um aumento de 12% na produção de café, explicada exclusivamente pela polinização feita por aves e abelhas.
E há mais: estudos realizados no Brasil apontam aumentos ainda maiores até 30% da produção pode ser explicada pela polinização. É outro benefício direto da arborização. Quando conseguimos harmonizar o desenho do sistema produtivo com a biodiversidade, os ganhos vêm de vários lados.
E todos aqui conhecem esse drama: a geada. A história das geadas no Brasil é antiga antes mesmo de muitos de nós nascermos. Eu já vi pelo menos 60 episódios no meu tempo. Geada é, há décadas, um dos principais riscos climáticos para a cafeicultura.
E vejam que interessante: essa foto é de um cafezal brasileiro. Pesquisadores do Paraná, liderados por Baggio, se surpreenderam com um experimento que mostrou que cafezais arborizados com apenas 70 árvores por hectare estavam protegidos da geada. Essa publicação é de 2004. Mas esse conhecimento vem de muito antes.
Lá nos anos 1940 e 1950, um pesquisador do IAC dos mais antigos foi chamado à estação de Campinas após uma geada severa. E o que encontraram? Dois talhões com a mesma variedade, o mesmo manejo, o mesmo solo, tudo igual. Mas um deles havia resistido à geada. Qual era a diferença? Apenas uma árvore protegendo o café.
Ele conduziu um experimento e comprovou: a arborização protege contra a geada. E estamos falando de estudos da década de 1950! De alguma forma, perdemos a memória desse conhecimento.
Hoje, mais do que nunca, precisamos resgatar essas informações e integrá-las à prática. De forma natural, sabemos que quando a temperatura ultrapassa os 25 °C, o café arábica começa a sofrer. O limite está claro — e a natureza vem nos dizendo isso há muito tempo.
Realizamos estudos em áreas cafeeiras da América Central e o que observamos foi alarmante: nos cafezais a pleno sol, às 8 da manhã, a temperatura já alcançava os 25 °C. Isso mesmo: às 8 horas da manhã, o café já está no limite de tolerância térmica.
Fomos aprofundar ainda mais. Às 9 horas da manhã, os estômatos estruturas que controlam a perda de água na planta já estavam completamente fechados. Fechados! Isso significa que a planta está lutando desesperadamente para não perder água.
Quando o café não está em estresse hídrico, os estômatos permanecem abertos, e a planta segue com seu metabolismo normal: fotossíntese, respiração, troca gasosa. Mas quando fecha os estômatos tão cedo, ela está nos dizendo: 'Pelo amor de Deus, liguem o ar-condicionado aqui!' E que ar-condicionado é esse? É a sombra. É a árvore. Não sou só eu dizendo isso. É a planta que está gritando. Escutem o café. Se não quiserem me ouvir, escutem o café.Tem gente que ainda diz: 'Ah, o café ama o sol pleno!' Pelo amor de Deus! Se fosse assim, os produtores da
Amazônia não estariam me chamando. E o que eles dizem?
'Professor, o senhor está me dizendo que lá na América Central querem migrar para o robusta por causa do aumento da temperatura. Mas aqui, o nosso robusta está morrendo. Está secando.' E me mostraram: duas plantas lado a lado. Uma verdinha, linda. A outra, seca, estressada. Aparentemente com o mesmo manejo, mesmo solo, mesma irrigação. A dúvida era: seria praga? Seria doença?
Fomos investigar e encontramos o “milagre”: havia um ingá crescendo na beirada da área, quase fora da lavoura. Aquela sombra parcial proporcionada por uma única árvore estava ajudando a planta ao lado a escapar do estresse térmico. A partir daí, implantamos um experimento com ingás, e os resultados foram claros: os ingás ajudavam a reduzir significativamente o estresse hídrico nas plantas de robusta. E atenção: não estamos nem falando do arábica ainda!
O café, por sua natureza, pede cerca de seis horas de luz por dia com temperaturas abaixo dos 25 °C. Isso é fisiologia, não é opinião. Agora pensem: que horas o sol nasce aí na sua propriedade? Seis, seis e meia? Sete horas? Pois é. Se o sol nasce às 6h30, e às 8h já temos 25 graus, o café já entrou em zona de sofrimento térmico com menos de duas horas de luz! Então, como manter um café saudável e produtivo a pleno sol em um clima que não respeita mais os limites fisiológicos da planta? É simples: não dá.
Hoje o sol está nascendo por volta das seis horas, certo? Pois é. E precisamos ficar atentos não só ao horário em que a luz incide, mas também à temperatura que vem junto com ela. O café não precisa de muitas horas de luz, nem de temperaturas elevadas. É uma planta que requer equilíbrio. E é justamente esse o segredo da arborização: garantir temperatura mais baixa e um tempo de radiação controlado.
Os estudos mostram que o ideal para o cafeeiro são cerca de seis horas de luz e não aquela radiação intensa do pleno sol. Quando há extremos de radiação e temperatura, a produção do café é afetada.
A folha do café, por exemplo, pode chegar a ter até cinco graus Celsius a mais do que a temperatura ambiente sob o sol pleno. Então, se o termômetro marca 30 ou 31 °C, a folha está a 35 ou 36 °C. Essa diferença é crucial. Por isso, sempre que vocês olharem para o termômetro, adicionem cinco graus para imaginar o que a folha está sentindo e entender por que ela seca.
É por isso que a arborização precisa reduzir a temperatura do ambiente, para que a planta esteja em conforto térmico, ou como gosto de dizer: cômoda.
Também estudamos a temperatura do solo. Fizemos isso na visita à propriedade do Marcelo e em várias áreas da América Central. Descobrimos que, no pleno sol, o solo pode ficar de três a quatro graus mais quente que a temperatura do ar. Já nos sistemas arborizados, a temperatura do solo se aproxima da temperatura ambiente o que é muito mais saudável para a raiz.
E esse conhecimento não é novo. A EPAMIG já publicou, em 2016, uma recomendação clara: diante do aumento das temperaturas, os produtores devem considerar a arborização. E mais a EPAMIG recomenda que não se tenha medo de começar com pelo menos 30% de sombreamento. Está lá, escrito. Agora, com base nos nossos estudos, podemos afirmar: sombreamento inferior a 30% é praticamente o mesmo que pleno sol. Ou seja, 30% é o mínimo que devemos buscar para alcançar efeitos reais no microclima do cafezal.
E esse percentual precisa ser ajustado conforme o objetivo de cada propriedade. Por exemplo, Rafael, você quer produzir água? Ótimo. Então veja esse dado: em um ano, um cafezal a pleno sol pode perder até 1.327 milímetros de água. Isso é mais do que chove em muitas regiões do Nordeste brasileiro ao longo de um ano inteiro. Já pensou?
Esse é o nível de perda de água que enfrentamos — e é por isso que a arborização, além de proteger, é também uma estratégia de produção de água.
No centro do sertão da Paraíba, tem anos em que chove apenas 700 milímetros. E, no entanto, em um cafezal a pleno sol, posso perder até 1.327 milímetros de água por evapotranspiração.
Ou seja, perco quase o dobro do que chove em regiões semiáridas!
É um absurdo. Eu digo que o café precisa de umidade — mas, quando está exposto ao sol pleno, essa umidade vai embora rapidamente.
Fiz o teste: coloquei árvores madeiráveis, arborizei. A perda caiu para 1.052 milímetros. Depois, implementei sistemas com ingás — leguminosas nativas — e a evapotranspiração caiu para 703 milímetros. Vejam só: reduzi pela metade a perda de água!
Então, fica claro: a arborização reduz a perda. E quando combinamos madeiráveis com leguminosas, como os ingás, conseguimos uma eficiência ainda maior. O caminho é esse: precisamos infiltrar mais água e perder menos. Precisamos reduzir as emissões de carbono e, ao mesmo tempo, capturar e armazenar esse carbono no solo e nas árvores. Esse é o jogo inteligente que devemos fazer.
E tudo isso que estou compartilhando com vocês aqui começou a ser discutido com as instituições da Costa Rica há cerca de 15 ou 20 anos. Na época, apresentamos os dados ao Instituto do Café (ICAFE), ao Ministério da Agricultura e ao Ministério do Meio Ambiente. E essas instituições nos pediram apoio para desenvolver um pacote — ou melhor, um protocolo de produção de café adaptado ao clima.
A Costa Rica se tornou o primeiro país do mundo onde os produtores de café e as instituições públicas firmaram um pacto nacional para mudar as práticas agrícolas frente às mudanças climáticas. E quais foram as práticas priorizadas nesse pacto, há 15 anos?
1. Sistemas agroflorestais melhorados — já existiam, mas precisavam ser aperfeiçoados.
2. Uso eficiente da água e da energia.
3. Redução e substituição de fertilizantes nitrogenados sintéticos.
4. Manejo de resíduos na produção e na industrialização.
Ou seja, deixou de ser um esforço isolado de produtores ou pesquisadores. Passou a ser política pública.
E por que estou tão emocionado ao falar disso? Porque, nos últimos dois anos, esse movimento ganhou ainda mais força. Vocês já ouviram falar do Pacto Verde Europeu? Já ouviram esse nome?
Pois bem. Em março de 2019, durante uma Assembleia das Nações Unidas, todos os países da União Europeia reuniram os principais relatórios sobre mudanças climáticas e chegaram a uma conclusão unânime:
A ciência comprovou que estamos caminhando rumo ao colapso climático.
Em 2019, a Assembleia das Nações Unidas aprovou uma resolução histórica: convocou todos os governos, empresas e cidadãos do mundo a trabalharem exaustivamente, durante uma década, pela restauração dos agroecossistemas.
Foi a primeira vez que a ONU lançou um apelo direto e global pela recuperação da natureza não apenas em áreas protegidas, mas, especificamente, nas áreas agrícolas. Um chamado para restaurar, regenerar e reverter o colapso ambiental dentro da produção de alimentos.
Essa resolução de 2019 se tornou a base para um movimento político e econômico forte, especialmente na Europa como o Marcelo sempre dizia: um dos principais mercados do café brasileiro. Os governos europeus entenderam que não bastava se comprometer internamente. Era preciso estabelecer normas concretas para garantir a aplicação desse acordo em toda a cadeia de abastecimento.
Assim nasceu o Pacto Verde Europeu (European Green Deal), com um princípio claro:
"Nós, países europeus, precisamos nos adaptar às mudanças climáticas e restaurar nossos ecossistemas. Mas os países que quiserem comercializar produtos conosco também deverão seguir esses mesmos princípios."
Esse pacto está em fase de regulamentação final. Ainda este ano será definida a data exata em que entrará em vigor. E, a partir daí, nenhum país poderá vender café para a Europa se não cumprir os protocolos socioambientais estabelecidos pelo Pacto Verde Europeu.
Minha gente, e por que o Gabriel está aqui hoje com sua companheira? Por que o Marcelo, tão emocionado, abriu esse encontro com tanta força? Porque os mercados já começaram a se mover.
Em 2021 e 2022, os grandes compradores se deram conta do que estava por vir e começaram a preparar estratégias. Formaram grupos de produtores, lançaram iniciativas. A Costa Rica, por exemplo, saiu na frente. Uma única empresa, a Econ, já estruturou o primeiro cluster com 150 produtores trabalhando com agricultura regenerativa.
E aqui está a palavra-chave do nosso tempo: regenerativa.
No ano passado, a Costa Rica quis enviar uma mensagem clara ao mundo. Realizou um grande evento internacional e, durante a cerimônia, uma das maiores cooperativas do país anunciou a venda do primeiro contêiner de café livre de desmatamento — um dos critérios centrais exigidos pelo Pacto Verde Europeu.
E declarou, publicamente: “A Costa Rica está oficialmente matriculada no Pacto Verde Europeu.”
Diante das exigências do Pacto Verde Europeu, os europeus correram para a Costa Rica. Queriam saber: “Como vocês estão fazendo? Como conseguiram cumprir?” Porque, veja bem, o Pacto Verde exigiu que o café exportado seja livre de desmatamento — mas não explicou como implementar isso.
A Costa Rica, que já vinha se preparando, levantou a mão e disse: “Vamos mostrar como é possível.” Com base em imagens de satélite e informações espaciais, eles mapearam com precisão, desde dezembro de 2021 até hoje, quais áreas foram desmatadas e onde havia coincidência com plantios de café. E, com isso, criaram um protocolo nacional, mostrando que o país inteiro pode certificar sua produção como livre de desmatamento.
O anúncio foi feito no ano passado. Mas o Pacto Verde vai além: exige também sistemas agroflorestais, uso de bioinsumos e práticas de agricultura regenerativa. E foi com base nas pesquisas de longo prazo que ajudamos a sustentar que, nos últimos dois anos, construímos, em um processo intenso e colaborativo, a primeira Guia de Café Regenerativo da Costa Rica.
Essa guia orienta técnicos e produtores sobre como aplicar o conhecimento científico para restaurar os sistemas cafeeiros e, ao mesmo tempo, garantir alta produtividade.
Ficamos surpresos, inclusive, com a velocidade com que isso se tornou política pública. Claro, há desafios: muitos técnicos ainda não entendem completamente o conceito o que é natural e estamos agora iniciando o processo de massificação desse conhecimento em campo.
E vale lembrar: o café nasceu nas florestas da Etiópia. É uma planta de sombra. Os primeiros produtores, por mais de 150 anos, cultivaram café sob árvores, sem insumos externos. E quando me perguntam: “É possível produzir café de forma regenerativa?” Eu respondo: “Foi assim que se fez café no mundo inteiro por mais de um século!”
Não havia lojas de insumos, não havia vendedores. Era a natureza quem fornecia os serviços ecossistêmicos sombra, fertilidade, equilíbrio. Temos registros fotográficos de 1800, em Cocada (Costa Rica), que mostram cafezais parecendo verdadeiras florestas. E os agricultores daquela época manejavam biomassa, cuidavam das ervas espontâneas, faziam tudo com o que a natureza oferecia.
Mas então, o que mudou? O dilema surgiu nos anos 1960. Técnicos da Costa Rica e de outros países da América Central viajaram ao Brasil. E ficaram deslumbrados com a alta produtividade que viram por aqui. Voltaram dizendo: “Temos que acabar com a sombra. Vamos abrir o café.”
Eu conheci alguns desses técnicos, já aposentados, e eles me contaram: “Foi uma campanha nacional de eliminação da arborização.” E o que aconteceu? Dois anos depois, o café definhou. Perdeu vigor. A produtividade caiu.
Então foram investigar: “O que está acontecendo?” E aí veio a constatação: eles haviam ignorado uma parte importante da recomendação brasileira a parte que dizia que, ao eliminar a sombra, era necessário dobrar a fertilização, aumentar herbicidas, fungicidas, inseticidas...
Os produtores reagiram: “Ah, então está provado: a sombra estava ajudando no manejo! A gente tirou as árvores e agora precisa pagar para compensar o que elas faziam de graça.”
Conclusão? A Costa Rica não conseguiu eliminar a sombra. Até tentou. Fez alguns ajustes. Mas os próprios produtores perceberam que, sem a arborização, era necessário gastar muito mais com insumos e muitos não tinham condições de sustentar esse modelo.
E qual é a nova fase agora? A transição dos sistemas agroflorestais tradicionais que foram mantidos por décadas, mas com pouco manejo para uma abordagem verdadeiramente regenerativa.
Esse é o papel da nova guia: orientar os produtores sobre como sair do pleno sol, reduzir a carga química e migrar para sistemas com uso de bioinsumos em cafezais arborizados.
Essa tabela foi construída com base em estudos científicos e avalia os impactos sobre seis dimensões fundamentais: solo, produção de água, biodiversidade, produtividade, rentabilidade e adaptação às mudanças climáticas.
Agora vejam a situação dos sistemas a pleno sol, com altas cargas químicas. Os resultados são claros: não conseguimos atingir os valores mínimos necessários para restaurar o solo, nem para melhorar a disponibilidade de água, nem para promover biodiversidade muito menos para garantir adaptação climática.
Está provado cientificamente: não há esperança restauradora em sistemas a pleno sol com manejo convencional intensivo.Mas observamos algo interessante: mesmo permanecendo no pleno sol, quando reduzimos a carga química, começamos a ver algumas melhorias. Aparecem os tons azuis na tabela — que representam impactos positivos.
Por exemplo: se mantenho a cobertura do solo, como o Marcelo tem feito, e reduzo o uso de agroquímicos, já vemos indicadores ecológicos começarem a reagir. Por isso o Brasil se emocionou com a cobertura do solo porque ela, de fato, já oferece uma contribuição significativa.
No entanto, pessoal, ainda há um longo caminho a seguir. Apenas reduzir a carga química e manter cobertura vegetal não é suficiente para:
· Restaurar a microbiologia do solo,
· Descontaminar a água,
· Produzir água em quantidade e qualidade,
· Criar conectividade ecológica por meio de corredores biológicos.
Para dar esse próximo passo, é indispensável incorporar as árvores ao sistema produtivo.
E o que é surpreendente e ao mesmo tempo confirmador é que, mesmo com alta carga química, quando introduzimos árvores no sistema, os benefícios ecológicos disparam. Isso foi comprovado.
Alguns ecologistas me disseram: “Elias, o que você está mostrando é incrível. Mesmo com o manejo ainda convencional, as árvores melhoram as condições do ambiente.” E eu respondi: “Sim, eu não posso mentir. Foram 25 anos de pesquisa. Os dados estão aí.”
Pegamos um sistema com alta carga química e arborizamos. O resultado? Melhoria expressiva nos indicadores de solo, biodiversidade, microclima e até resiliência.
Aqui temos um exemplo extremo: alta carga química, o chamado “pacote do Diabo” com veneno, fertilizantes sintéticos e tudo mais. Mas mesmo nesse cenário, eu introduzi árvores leguminosas em alta densidade. E vejam só: os indicadores ecológicos reagiram fortemente. Dispararam.
Mas nem tudo foi resolvido. Sabe o que não conseguimos corrigir? O problema da acidez do solo. Com alta carga química, isso persiste. Também não conseguimos descontaminar o solo nem os frutos. E isso é grave. Muito grave.
Já foram encontrados resíduos de glifosato na bebida de café brasileiro. E deixo aqui um alerta: se vocês venderem um lote com altos índices desse resíduo, correm o risco real de perder o mercado internacional. Além disso, a biodiversidade segue limitada nesses sistemas. E sem diversidade, não há adaptação plena às mudanças climáticas.
Por outro lado, conseguimos desenvolver sistemas cafeeiros livres de químicos convencionais, com arborização adequada, que atingem um nível elevado de restauração. Foi então que alguns colegas do setor chegaram até mim e disseram: “Mas Elias, 23 sacas por hectare é muito pouco. Para esse café que você defende, a gente precisa de produtividade de 25, 30, 40, até 50 sacas.” E eu respondi: “Calma. Estamos falando aqui do caturra, uma variedade que, aliás, praticamente desapareceu da região.”
Mesmo assim, conseguimos resultados expressivos. Em um sistema orgânico intensivo, aplicando 10 toneladas de matéria orgânica por hectare, usando rocha moída, bioinsumos foliares e manejando bem o solo e a arborização, atingimos 23 sacas com caturra. Isso, sim, é eficiência dentro de um modelo regenerativo.
Consegui, com apenas 5.000 kg de adubo orgânico por hectare a metade do que muitos usam e com poucas aplicações, uma produtividade de 59 sacas de café por hectare. O pessoal ficou impressionado.
Como foi possível produzir mais do que o caturra com alto pacote químico, que ao longo de 17 anos teve uma média de 47 sacas por hectare, mesmo usando 300 kg de nitrogênio por hectare?
A resposta está na combinação estratégica de três elementos fundamentais:
1. Uma boa arborização,
2. Uma variedade melhorada, adaptada ao sistema,
3. Um manejo eficiente com base em adubação orgânica — cerca de 1 kg por planta.
Esses resultados estão sistematizados no manual de Café Regenerativo da Costa Rica, que orienta produtores a construírem seu caminho em etapas. Não é preciso dar um salto gigantesco de início a transição pode (e deve) ser feita passo a passo. E mesmo esses primeiros passos já trazem respostas concretas.
A guia reúne os pilares essenciais da agricultura regenerativa, mas vai além do que já se conhecia. Trouxemos novidades importantes:
· Incluímos aspectos microclimáticos, fundamentais no caso do café.
· Incluímos aspectos políticos e de governança.
· Fizemos uma revisão detalhada das boas práticas específicas para cafeicultura.
O manual organiza os temas em áreas de diagnóstico solo, práticas agronômicas, biodiversidade, água, microclima, aspectos econômicos, sociais e legais. Cada um desses temas tem seus indicadores específicos para análise.
A Nespresso, por exemplo, tem uma profissional dedicada exclusivamente aos aspectos sociais.
Porque o regenerativo não é só ambiental é também social, é também justo.
Criamos então uma escala de referência, que vai do degenerativo ao regenerativo:
· Degenerativo: pleno sol, alta carga química.
· Transição básica: redução de carga química, ainda sem arborização.
· Transição estruturada: redução química + início de arborização + protocolos complementares.
· Regenerativo (verde e azul): sistemas mais avançados, com forte impacto positivo já comprovado.
A boa notícia, Marcelo, é que você provavelmente já está no verde! Só precisamos avaliar. E se estiver mesmo, você já merece ser reconhecido por políticas públicas, diferenciação de preços, acesso a mercados com exigências ambientais.
E isso não é um acordo informal entre eu, você e os produtores. É ciência. É o que a pesquisa está mostrando: que quem cumpre certos protocolos contribui efetivamente para a regeneração da paisagem e merece valorização por isso.
Inclusive, vale dizer: é possível estar em um sistema regenerativo mesmo utilizando alguns agroquímicos sintéticos desde que o uso seja controlado, contextualizado e compatível com os demais critérios.
No entanto, o nível mais alto da escala o azul corresponde à produção livre de químicos sintéticos, com arborização e práticas regenerativas completas. Esse é o objetivo mais avançado.
A Guia de Café Regenerativo da Costa Rica, que vou deixar com vocês, serve também como instrumento para contextualizar a situação brasileira. Ela traz uma matriz de autoavaliação muito prática. Para cada indicador solo, biodiversidade, água, microclima, práticas agronômicas, aspectos sociais e legais você deve marcar com um "X" a opção que mais se aproxima da sua realidade. São quatro níveis de resposta. No final, o nível onde você tiver mais “X” representa sua situação atual.
Agora, tem uma regrinha importante... (risos)
Se o Marcelo, por exemplo, marcou um monte de “X” no nível 3 (verde), mas ainda tem ao menos um “X” no nível degenerativo... Marcelo, sinto muito — você volta para o jardim da infância!
É como naquele joguinho: basta um ponto crítico no nível degenerativo, e todo o sistema perde o direito de avançar. Por quê? Porque o degenerativo representa riscos sérios, estruturais. Enquanto houver um ponto crítico não resolvido, não se pode gozar do status regenerativo.
Mesmo que alguém diga: “Ah, mas eu sou orgânico, já estou no nível 4.” Se houver um “X” lá no básico ou no degenerativo, é preciso recuar e resolver esse ponto.
Esse é o coração do modelo: identificar onde estão os gargalos e priorizar as ações corretivas. Cada “X” em nível inferior revela uma missão. Resolver esse ponto é o caminho para, de fato, alcançar o reconhecimento e os benefícios do sistema regenerativo.
Então, o modelo da Costa Rica foi formulado dessa forma: claro, objetivo, participativo e alinhado com a ciência. Agora, na sequência, vamos explorar as alternativas e caminhos possíveis para aplicar essa abordagem por aqui.
Nós já temos, no Cerrado das Águas, propriedades que estão trilhando esse caminho. Temos o Marcelo, temos outros produtores. E ontem mesmo tivemos uma manhã riquíssima de negociação com o Washington.
Foi muito interessante porque o Washington deixou claro: “Isso aqui eu negocio. Isso aqui, não.” E isso é excelente! O produtor tem que ter esse espaço. Tem que poder dizer: “Olha, isso não está dentro das minhas possibilidades no momento.”
E mais: o Washington foi além. Ele disse: “Professor, nisso aqui eu posso fazer mais.” Ele estava disposto a avançar onde fazia sentido e também foi transparente ao dizer onde não podia, por limitações reais. Isso é o mais importante: construir juntos, com honestidade e realismo, o caminho da transição.
Cada propriedade vai desenhar sua própria trajetória: quais espécies usar, qual tipo de arborização adotar, qual manejo aplicar. E eu nem vou falar muito do Marcelo, porque ele vai ter o espaço dele para contar o que conseguiu construir nesses anos. Mas vejam: ele já está com o sistema arborizado há seis anos. Seis anos, minha gente! Em termos de restauração, isso é o mesmo que dizer: seis dias. Estamos só começando e já temos muito a aprender com essa experiência.
Inclusive, quisemos verificar na prática o que ele vinha nos dizendo. Pegamos o termômetro que a Fabiana trouxe e fizemos a medição comparativa: temperatura do solo próximo à influência das árvores e em uma área mais exposta, no centro da lavoura. A diferença chegou a quase quatro graus! Mais quente no solo a pleno sol.
Esse dado confirma tudo o que a ciência já dizia mas agora está ali, na lavoura do Marcelo. A arborização, além de tudo, é um ar-condicionado natural para o solo e para o café. E o Cerrado das Águas já está colhendo os primeiros frutos disso.
Uma diferença de quatro graus na temperatura do solo já interfere diretamente na saúde da planta e na dinâmica da microbiologia. Por isso, já sabemos que há uma área no centro da linha de café do Marcelo que precisa de atenção. Precisamos pensar em estratégias para reduzir essa temperatura e seguir avançando no modelo.
Vamos olhar para outras experiências. A Fazenda Pedra Preta, localizada em Cariaçu, Minas Gerais, tem 200 hectares dos quais 83 são de café e já está há vários anos com sistema de arborização. Vamos visitá-los novamente nesta semana, e os relatos são animadores. A equipe está contentíssima com os resultados dos sistemas implantados.
Temos também o exemplo do Diogo Carvalho, em Baixa Mogiana, São Paulo. Ele trabalha com 100% de produção orgânica em café, com cobertura do solo e barreiras contra o vento.
Outro exemplo é o Victor Sebastião, aqui mesmo em Minas, na fazenda Bela Terra, onde trabalha com fileiras de abacate. Sugerimos a ele uma integração de abacate com árvores leguminosas, e ele já está colhendo bons resultados com essa combinação.
Cada produtor está desenhando seu próprio modelo e é exatamente isso que o Cerrado das Águas quer estimular: adaptar boas práticas às diferentes realidades, respeitando a vocação de cada propriedade.
A Fazenda Pedra Preta, inclusive, está fazendo, em 200 hectares, o que o Cerrado das Águas deseja ver em toda a região: conectando áreas, restaurando paisagens e estruturando sistemas agroflorestais adequados a cada ambiente.
Lá, trabalham com dois modelos distintos de SAF (Sistema Agroflorestal):
1. O modelo “Aleia”, como o do Marcelo: fileiras de árvores intercaladas com fileiras de café. O Marcelo, por exemplo, tem de 10 a 11 fileiras de café entre 5 a 6 fileiras de árvores. Ele buscou esse equilíbrio, testando com macadâmia e outras espécies, procurando um bom balanço entre produção de café e outras culturas.
2. O modelo “Mantiqueira”: arborização em toda a área para promover controle total do microclima. Nesse modelo, a colheita é mecanizada, assim como o manejo do solo. Já no modelo Aleia, o manejo do solo é mecanizado, mas a colheita ainda é manual.
E quando eu coloco a cabeça no travesseiro, sabe o que eu sonho? Com esse paraíso: o café crescendo debaixo de um sistema equilibrado, biodiverso, produtivo. Um café com alma, com sombra, com vida.
Já temos áreas que estão nesse nível com biodiversidade funcional, produtores engajados, qualidade de bebida e produtividade elevadas. Mas para chegar lá, é preciso avançar passo a passo. Aprendendo, testando, adaptando.
A pergunta certa é: como posso mecanizar a colheita sem perder os benefícios do sombreamento? Como posso manejar tecnicamente as árvores para garantir eficiência e regeneração?
Já há propriedades que estão chegando nesse nível. E esse minha gente é o café do futuro.
À medida que a gente vai aprendendo, vamos adaptando esse conhecimento à realidade brasileira. E qual é o meu sonho, minha gente? Que vocês possam plantar uma árvore leguminosa na linha do café no mesmo dia em que forem colher o café. Sim, no mesmo dia!
Com o Hoste, por exemplo, isso já está encaminhado. A gente já fez esse acordo, não foi, Hoste? Estamos combinados. O que vamos mostrar juntos? Que é possível integrar árvores leguminosas ao sistema cafeeiro e mais do que isso: fazer isso de forma que a mecanização da colheita continue funcionando perfeitamente.
Já está provado que as leguminosas enriquecem o solo, melhoram o microclima e favorecem a vida no sistema. Mas muita gente se pergunta: ‘Como aplicar isso no cafezal todo se eu dependo de máquina para colher?’. A resposta é técnica: vamos provar, na prática, que dá para manejar essas árvores de forma compatível com a colheita mecanizada.
Eu mesmo fiquei surpreso da primeira vez que vi a máquina de colheita funcionando. Me diziam que não dava para ter árvore ali. Mas pensem comigo: se eu podo a leguminosa a 1 metro e meio, ou a 2 metros, ou na altura que for necessário sempre antes da máquina passar, então por que não? É só manejo. É só técnica.
O que precisamos, agora, é alinhar desenho agroflorestal com eficiência operacional. Porque, sim, dá para ter árvore, dá para ter máquina e dá para ter um café mais sustentável, mais resiliente, mais produtivo. Esse é o caminho que já começamos a trilhar.
A máquina pode passar levando o café e a árvore leguminosa continua ali, firme, sem problema algum. Essa é a hipótese que vamos testar com o Hoste. Vamos validar na prática se o manejo correto permite que a mecanização e a arborização coexistam com eficiência.
E, claro, a gente também pode acompanhar o crescimento do tronco, o diâmetro das árvores. Quando não for mais compatível com a colheitadeira, a gente faz uma poda, conduz uma nova árvore no lugar. Isso é sistema agroflorestal com manejo técnico, com visão de longo prazo.
Estamos avançando nesse caminho.
E aí, fomos até o Espírito Santo, visitar uma propriedade da família do Tiago ele, os pais e os irmãos. Eles já vendem metade do café com marca própria e a outra metade pelo sistema tradicional. E olha que interessante: havia um talhão com café velho. Resolveram plantar abacate ali, por causa do preço bom. Colheram 20 mil quilos de abacate num ano. O mais barato a R$1,50, o mais caro a R$3. Façam as contas! Foi um excelente retorno.
Com esse resultado, decidiram acabar com o café e ficar só com abacate. Mas, surpresa: o café não parou de produzir. E o pai bateu o martelo: ‘Não tira o café não, o preço está subindo!’. Aí ficou aquela floresta de café com abacate, toda embolada. E eu perguntei: ‘Vocês nem podaram o abacate?’ Eles riram. Estavam no dilema queriam tirar, mas não tiraram. E agora precisam manejar.
Eu disse a eles: ‘Imagina se vocês manejam a arquitetura do abacate para permitir a convivência harmoniosa com o café?’. E foi aí que surgiu a ideia: organizar melhor os plantios.
Em algumas áreas eles já têm linhas organizadas de abacate. Agora querem intercalar com árvores leguminosas, para melhorar a estrutura do sistema e o microclima. E onde ainda está tudo misturado, a meta é ordenar melhor. Eles fazem a colheita manual, então não há empecilho, e querem seguir com o café.
Ou seja: a própria prática, a experiência no campo, mostra que dá certo. Dá para pensar em consórcios, dá para planejar, dá para transformar. O que era uma transição virou inspiração. Cada lugar tem suas possibilidades e o segredo é adaptar com base no que a ciência já mostra e no que o produtor deseja e pode fazer.
Citei um estudo brasileiro importante, feito pela INCAPER, no Espírito Santo, com diferentes sistemas de produção de café. Avaliaram áreas em pleno sol, com ingá, com banana, com gliricídia (uma leguminosa) e com pupunha. Foram quatro colheitas. O que aconteceu? O café em pleno sol perdeu para três sistemas arborizados. Só venceu o sistema com banana. Ou seja, está comprovado: sombras bem manejadas podem gerar produção de qualidade no café no Brasil.
Portanto, nossa proposta deve ser construída em diálogo com cada produtor e produtora, respeitando seus interesses e realidades, mas embasada em critérios técnicos. O Cerrado das Águas já tem um acervo de informações riquíssimo e estamos trazendo ainda mais conhecimento. Mas esse diálogo precisa ser técnico e concreto. Precisamos de:
· Número de árvores por hectare;
· Desenho das linhas de plantio e espaçamento;
· Espécies selecionadas (frutíferas, madeiráveis, leguminosas);
· Potencial de renda complementar (mel, frutas, madeira, serviços ambientais);
· Custos estimados e receitas potenciais.
Diversificação é chave. Cada grupo de árvore cumpre uma função: → Frutíferas podem trazer renda rápida. → Madeiráveis podem oferecer retorno a médio e longo prazo. → Leguminosas contribuem com ciclagem de nutrientes e microclima.
Tudo isso combinado de forma inteligente permite ao produtor controlar dinamicamente o ambiente do seu cafezal. Isso significa manejar:
· A temperatura: Com sombra no verão e abertura de luz no inverno.
· A umidade: Protegendo no tempo seco e abrindo no tempo chuvoso.
· A entrada de luz: Com podas estratégicas — leves ou mais intensas, conforme a estação.
Esse manejo dinâmico das copas pode (e deve) ser feito com o apoio de ferramentas adequadas como podadoras telescópicas motorizadas para garantir praticidade e precisão. É isso: deixar de ser refém do clima e passar a ser o gestor do seu próprio microclima. Dominar a umidade, temperatura, luz — e fazer isso com planejamento, técnica e sensibilidade.
E, como ontem, quando negociamos com o Washington uma área de 1 hectare e ele, com sabedoria, colocou seus limites e também se propôs a fazer mais, a gente percebe: esse trabalho se constrói junto. Cada propriedade é um universo. Cada diálogo, uma nova oportunidade. E, às vezes, esse universo começa com o que chamo de... um cavalo de Troia.
“Vamos ver se funciona mesmo contra a geada.” Foi assim que começou nossa conversa com o pessoal da área do Bachil. Plantamos café exatamente onde, historicamente, bate a geada e ali desenhamos o sistema para testar se a arborização realmente protege. O produtor nos provocou: "O senhor disse que protege, então vamos ver se é certo mesmo!" E isso é ótimo. A ciência precisa desse chão, desse teste no real. Estamos falando de uma área de pouco mais de 1 hectare, com todo o desenho já feito e cada lugar vai nos ensinando, passo a passo.
Aliás, o próprio Bachil nos mostrou documentos históricos da área, e isso foi fundamental para entender a dinâmica da geada e elaborar um desenho que considerasse a posição do vento frio, a rota do sol ao longo do dia e a orientação das linhas do plantio. Cada detalhe importa.
E mais: vamos provar nesse sistema a viabilidade da mecanização, mesmo em áreas arborizadas. Porque um dos grandes desafios é aliar manejo mecanizado à complexidade dos sistemas agroflorestais. Mas é possível, sim. Basta adaptar.
E veja que negociação bonita: o café vai até certo ponto. Daquele ponto para baixo onde a geada pega mais forte a área foi destinada a experimentação e conservação. Ele disse: “Daqui para baixo, podem ficar com tudo.” É nesse espírito que estamos construindo juntos.
Agora, escutem só esse raciocínio do produtor que estava ali com a gente, pensando alto: “Se eu tiver 11 linhas de café e uma de árvore, a gente perde 1/12 da produção. Perde, porque a árvore não dá café. Mas se eu boto só mogno africano, por exemplo, em sistema puro, para colher daqui 25, 30 anos, quando eu for fazer a poda, destruo tudo o que construí no solo e no microclima. Então o segredo está na diversidade de espécies, com copas em alturas diferentes e funções complementares.”
Ele mesmo respondeu sua dúvida, apontou o caminho. Por isso que nos nossos desenhos não colocamos só uma espécie colocamos madeiráveis, leguminosas, frutíferas árvores que interajam entre si e com o café, respeitando o ciclo da cultura e oferecendo sombra, nutrientes, biodiversidade, renda e regulação do clima.
E ainda provocou mais: “Se tiver mogno, beleza. Mas ele precisa ocupar só 5% da área e a poda dele tem que casar com a poda do café. Se ele cai para o lado errado, atrapalha tudo.” Isso é construção real. É inteligência prática, somada à pesquisa. É o que estamos chamando de café regenerativo, e é o café do futuro. Um café que escuta a planta, escuta o solo mas, sobretudo, escuta quem vive da terra.
Eu retiro madeira coordenando com o momento de aproveitamento.Terminei o período do café. Primeira coisa: não tem café. O café vai entrar em repouso. Então, é excelente. Chegou o momento de você tirar a madeira. Você corta a madeira e direciona a queda da árvore para não afetar as árvores que você tem na linha.
Na nossa região a gente tem uma idade, 15 anos. Então, você vai tirar para os lados as árvores, e ele vai tirar para cima do café. O que vai acontecer? Muitas vezes a gente tem feito essa prática: a copa da árvore amortece a queda da árvore, e o que você vai ver é que, se você tem café que não foi podado, vai afetar a planta do café tirar folha, lâmina e tal.
Você tirou a madeira? Vai lá e poda o café. Pronto. Se tiver algum dano na planta com essa queda das árvores, recupera fazendo a poda no café. Então, a sua solução é essa: programar a poda das árvores depois da colheita, no período prévio à poda do café. Porque você pode perfeitamente programar quando quer renovar uma área também.
— “Eu vou renovar a área?” — “Normalmente é na renovação.” — “Normalmente é na renovação.”
Então, lá na América Central, quase sempre coincide com renovação. O pessoal... a árvore pode cair e não tem anotação de nada. Exatamente. Então, a ideia é direcionar a queda da árvore. Como é que a gente faz a direção? Com o corte. O corte ajuda a direcionar. Colocar uma corda tensora e uma máquina. Você bota a corda e pode tensionar a árvore ao lado que você quer. Então, você pode dirigir.
Nós temos técnicas para fazer isso e, efetivamente, eu posso pensar em modelos que me deem produtos. Eu posso pensar que vou retirar árvores quando eu cumpro o seu ciclo, mas eu já venho atrás plantando outras árvores. Eu já tenho outras árvores. Então, eu posso fazer o ciclo permanentemente. Essa é a ideia. E essa é uma das estratégias para associar a madeira.
— Algum outro comentário? — Sim?
Pois é. A gente está falando de algo muito importante.
Precisamos documentar o uso da terra dentro da propriedade do café, indicando quando a gente está estabelecendo um sistema agroflorestal, documentar as áreas com imagens e demonstrar que, quando eu vou fazer a intervenção, eu não estou intervindo na floresta. Eu estou intervindo no sistema agroflorestal. E, se eu tenho essa possibilidade de documentar que as árvores foram plantadas em sistemas arborizados, eu posso tirar as árvores sem nenhum problema.
Agora, nós estamos fazendo uma aproximação com o Cerrado das Águas, com um fundo de carbono. Então, vamos ver se a gente tem êxito, mas eles querem quantos hectares? Oito mil hectares. Oito mil hectares. Mínimo? Pode ser trinta mil hectares? Só oito mil. Só oito mil.
Então, eles dizem o seguinte: vamos cobrir toda a logística para o estabelecimento de reflorestamento, de sistema arborizado e também de restauração, não é isso? Parece loucura, não é isso? Mas só no corredor tem 135 mil em propriedades convencionais e não informais. Só dois associados. Tem que faltar as outras empresas e os elementos culturais. Então, não é uma loucura tão loucura assim?
Em termos de área, a gente sabe que a gente tem 182 mil hectares. Meu Deus do céu, isso é um desafio importantíssimo. Agora, eu fiz a brincadeira dos oito mil porque, se você estabelecer um programa de oito mil hectares, é peso. Mas eles têm dinheiro, é um fundo de investimento, e eles dizem: vamos fazer um contrato com o produtor e ele poderá aproveitar as árvores depois de vinte anos.
Então, o produtor que recebe o apoio desse fundo para estabelecer os sistemas, ele tem que manter, no mínimo, vinte anos as árvores. Então, o produtor já sabe. Bom, esse é um aspecto importante porque, por exemplo, uma espécie nativa, uma espécie madeirável precisa, no mínimo, vinte, vinte e cinco. Então, ainda bem que são vinte anos e não é vinte e cinco, mas você já pode fazer a colheita da árvore.
Então, eu considero que é uma oportunidade interessante porque dá ao produtor essa possibilidade de fazer o aproveitamento das árvores. E esse registro vai ser no CAR, se eu quiser o sistema de aproveitar? Para ele não considerar esse ato como desmatamento, eu vou ter que apontar isso no CAR? Onde seria esse ato que não consideraria que eu estou desmatando uma árvore?
É uma boa pergunta. É uma boa pergunta. No processo de aproximação desses fundos, o que a gente está interessado é que você demonstre uma arrumação das árvores que você não desmatou para apontar. Quer dizer, você tem que ter uma foto antes e depois. E uma coisa importante é que essa fotografia eles já têm. Tudo no Google Maps. Eles já têm, entendeu?
Então, ele vem com uma base da árvore lá no Google Earth. Tem uma versão do Google Earth que é paga, não sei como é que é a espécie. Então, você entra em detalhes de informação que o proprietário nem imagina. Então, o que eles precisam é de um respaldo numa imagem aérea para confirmar que você não desmatou a sua faixa.
E, evidentemente, se você quiser estabelecer um sistema de árvores num programa como esse, vai estar no comentário da descrição do programa o acesso aos benefícios. Eles cobriam toda a logística de plantas, insumos, todo o segmento, o manejo, o monitoramento. Espero que deixe essa decisão apontar o interesse. E aí, uma foto de drone também pode ser chamada por isso? Também, também. Exatamente.
Pode haver algum tipo de compensação? Se, às vezes, eu precisar de uma área e fizer essa nova área de compensação? Não pode. Quer dizer, foi uma arma que não pode. Às vezes, no momento em que você assume a área, ela tem que permanecer. Até mesmo quando vem com o coração.
Não é só uma pergunta que um dia lá é muito difícil. Às vezes, eu tenho que falar que, depois de nada, eu não quero mais essa área porque eu quero modificar essa área em outra, à beira de carreira. Às vezes, eu tenho, sei lá, uma árvore no meio de um café que eu preciso tirar. Aí, se eu puder trocar, eu tenho que colocar a mesma quantidade. Pode ser dentro dessa área que ele queria trabalhar?
É, se não fez parte do estabelecimento do programa, acho que não teria problema. Agora, a minha preocupação é quando a gente faz a negociação do desenho e o acordo, é preciso manter isso presente. Então, quando o produtor for lá nesse programa, ele tem que estar seguro de que essa área ele vai poder manter, quando fizer parte desse programa.
Agora, que existe muita legislação brasileira, existe. Eu preciso conhecer bem todo o detalhe da legislação brasileira para ver incentivos e restrições, para analisar todas as condições que vão aparecendo. Porque vai ter áreas que você inclui num programa com esse crédito de carbono, mas vai ter áreas que você não inclui. Tudo fica definido.
Então, para cada área, eu preciso ver o que o produtor pode ou não pode fazer, para informar bem. Ela percebe que essa área vai aparecer para mandar a gente ir para o CPS, ou, se um dia essa propriedade for vendida, o próximo contato tem que manter. Tem que manter, é isso aí. Fica registrado na lista. Exatamente.
Algum outro comentário?
Eu sei que no programa que está na Tira, o consultor está contando uma mensagem que ele fez, que ele fez para ser registrada, e depois ele vai fazer um manejo para tirar uma presença. Essa informação é para tirar?
É. Pois é. Importante isso, né?
Na caixa de rede eu tenho a CPC, e para o encontro, você não acha que eu estou contando uma mensagem? Eu estou contando uma mensagem com uma água preciosa, com uma árvore, porque eu não plantei o mais jovem do carro. Aí foi o carro, este elemento, e ele disse: "Olha, eu vou plantar outras aí para apanhar."
Você plantou aí na área de preservação? Você não pode. Mas eu queria plantar aí, né? Mas não pode, você plantou na área de preservação. As águas da Caixa Rica têm áreas de 15 a 50 metros. Se você plantou aí, é para restaurar e proteger.
Então, se você quer aproveitar a madeira, você tem que plantar fora dessa área. Com os movimentos da caixa de rede, com os movimentos da caixa de rede, você precisa de uma velocidade externa, exatamente fora dessa área, que podiam plantar na área de restauração e fora, né?
Então, hoje, os sistemas agroflorestais madeirados na Costa Rica sempre se orientam ao produtor a colocar as madeiradas dentro das áreas de produção, que ele pode aproveitar a madeira. E as áreas de restauração não vão ser essas que ajudem a proteger o curso de água, né?
Igual para registrar o plantio que vai ser aproveitado? Sim, mas não tem...
A área da Costa Rica é a maior propriedade de café que está na madeira? É... 150 hectares, 700 hectares. A propriedade é maior, mas de café é como 700 hectares.
Mas é plantada de café? Plantada de café. Ela foi uma das que eu encontrei tirando a sombra em 2000. Então, ironicamente, as comunidades vizinhas da propriedade foram ao CATIE de apoio para visitar a propriedade, porque as fontes de água nasciam dentro do café.
Então, veja minha posição. A primeira visita que eu fiz foi para acompanhar as comunidades vizinhas que estavam questionando a empresa. E, quando eu cheguei, evidentemente encontrei a aplicação de herbicida nas fontes de água, químicos, desmatamento, né? E fizemos um trabalho de aproximação que logo gerou uma colaboração com eles.
Hoje, são certificados, vêm fora em Salais. Já se matricularam com o regenerativo. Fazemos pesquisa e todo o café é arborizado. Eles têm cinco comunidades que têm água nascendo dentro da propriedade. É feita a avaliação da qualidade da água. Está livre de químicos e com boa produção de água. É um exemplo interessantíssimo.
Estamos estimulando o Cerrado das Águas a conseguir o intercâmbio com a Costa Rica.
Esperamos conseguir esse apoio, porque vocês vão ter a oportunidade de ver uma propriedade de mil hectares que conseguiu mudar 700 hectares ao longo de 20 anos. Está inserida em opções de mercados interessantíssimos, com a sua marca, e muito satisfeita dessa trajetória.
Não percebi aí que você estava coletando, mas já está no seu celular. Está certo, está legal, que bom. Então, essa é uma referência importante. Não só propriedades pequenas — uma propriedade grande. E vejam que eles estão apenas começando a mecanização da sombra. Começaram recentemente.
Todas as espécies que a gente tem aqui, como o ingá, o potencial do ingá é... Todo o potencial do ingá é de milho, província de Passagem. Muito provavelmente todos os ingás fixam nitrogênio na raiz. Agora, tem ingás que têm particularidades específicas. Por exemplo, o volume da biomassa aérea, a capacidade de aguentar poda — uns aguentam mais poda que outros.
Então, é preciso ver o custo disponível e ir provando e analisando. Esse é o desenho. A gente vem trabalhando com desenhos que permitem as árvores madeiráveis distantes.
Por isso o Marcelo começou com o baixo risco. Queremos árvores madeiráveis distantes. As árvores madeiráveis — a ideia é conduzir poda de formação no tronco para que ela vá lá para cima e permita a entrada nisso. Eu tenho o controle do microclima lá em cima. Eu tenho a biodiversidade lá em cima, não é? Ok. Mas eu tenho também a necessidade de ter o microclima embaixo. Então, o microclima debaixo deve ser dado pelas leguminosas controladas.
E as leguminosas têm que ser podadas, no mínimo, duas vezes no ano, para incorporar a matéria orgânica, melhorar o solo e a entrada de luz no sistema. Então, eu não posso, na minha concepção, ter as leguminosas dentro de todo o café em nível crescido. Isso afetaria o domínio do microclima e poderia afetar a produtividade. Por isso é delicado. O custo operacional também, eu acho que aumenta bastante. Então, precisamos de um custo manejável.
Se as árvores não notam ainda o crescimento, eu tenho que subir lá em cima, na copa, e isso pode inviabilizar o sistema. Eu já vi modelos regenerativos com muita árvore dentro do café e o povo subindo de escada a 10, 12 metros de altura com motosserra. Um risco tremendo, um custo elevadíssimo, muito trabalho. Então, qual é a ideia? Árvores madeiráveis bem distantes e as leguminosas baixas, manejadas com a roçadora.
Eu posso, amanhã, manejar a copa de até 100 árvores. Mas a arquitetura dessa leguminosa tem que ser uma arquitetura de sombrinha, a uma altura que a roçadora alcance. Então, o custo de operação é totalmente diferente de estar subindo na copa da árvore. Porque aí a gente poderia, como a gente passa a trincha, tem as forrageiras, ele poderia fazer parte da dormência... Que é isso, não é? O que você acha? É uma leguminosa fácil, não é? Exatamente.
Então, vejam bem. Sempre me perguntaram: qualidade de biomassa, quantidade de nutrientes em leguminosa arbórea e uma leguminosa básica no sistema — o feijão guandu. Então, dependendo do meu desenho, eu posso ter toneladas de biomassa de fixação de nitrogênio superior, manejando as árvores.
O volume de fixação de nitrogênio, por exemplo, de uma árvore leguminosa — no caso do ingá —, pode fazer fixação de nitrogênio até 10 metros de distância. O guandu, a fixação de nitrogênio está ali. Entendeu? Está ali. Então, uma com outra — a árvore leguminosa ganha em potência. Você ganha no local e no remoto. Exatamente.
Não quer dizer que o guandu não tem papel no sistema. Por exemplo, eu vou estabelecer uma área nova. Eu vou começar do zero. Interessantíssimo você ter a companhia do guandu para ele poder fazer uma sombra temporal, para ele poder ajudar no solo.
Então, ele tem um papel fundamental nessa hora. Em Londrina, no Paraná, no passado, em décadas passadas, o pessoal fez um corredor de guandu plantando de um lado e do outro da fileira do café novo. E a ideia do corredor era proteger das geadas e proteger o café das geadas.
Então, eu dizia para o Hoste, por exemplo: um café novo, numa área de risco, vale a pena a gente colocar pelo menos uma fileira de guandu na entrada do vento frio, enquanto as árvores estão crescendo. Então, totalmente de acordo que pode ser uma espécie de sacrifício, totalmente. Mas ela tem o seu limite. Ela tem o seu limite do ponto de vista de biodiversidade, de fixação de nitrogênio e tudo mais.
A coisa é o lugar... e quanto que é essa fixação de nitrogênio no lugar? Certo. Porque a gente tem bastante lugar. A gente plantou em lugar com esses corredores, em fileiras e em outros. Certo. Mas, para ser sincera, não pode ir em um novo lugar. Acho que a gente ficou mal de contato. Não se preocupem. A gente deu o contato.
E aí também nós plantamos no meio, assim, do meu pelo e de vocês. Não, ele está na lateral. Na lateral, claro. Mas aí dá contato. Acabou que dá contato. E plantamos o ladeiro de pelar no meio. Mas a gente está bem lixando aí. Claro. Porque ele vai crescer e vai dar um troço mais velho.
Então veja, estamos no conceito de aprendizagem, e é normal, né? Então vamos gerando aprendizagem no conhecimento. Vamos começar primeiro com a fixação de nitrogênio.
Geralmente, as árvores leguminosas e as árvores em geral, elas têm, debaixo da terra, duas ou três vezes o comprimento que têm em altura, em raiz. Então a gente vê a árvore e a gente não imagina que ali debaixo da terra tem um volume de raiz que é três vezes o que está fora. Então isso quer dizer que ela cobre uma quantidade de solo, debaixo da terra, muito alto, em volume alto.
Pois bem, as leguminosas têm a particularidade de que, nas suas raízes finas, elas têm sociedade com bactérias e com microrganismos. Esses microrganismos se alimentam das raízes finas. E o que é que eles fazem? Devolvem e fazem a conta: capturam o nitrogênio que está no ar do solo — nós estamos respirando o nitrogênio —, existe uma quantidade de nitrogênio impressionante no ar, e no ar do solo também. Esses microrganismos capturam o nitrogênio do ar do solo e fazem nós, os nódulos. O feijão também faz, o feijão é leguminosa. A soja também faz.
Então, imagine que você esteja em cinco e oito meses mesmo embaixo da terra, cheio de nódulos carregados de nitrogênio. Então, quando esses nódulos maduram, esse nitrogênio é liberado para quem está por ali. Quem está na radiação dessas raízes pode absorver esse nitrogênio na forma que a planta necessita. Então, esse é o trabalho da fixação de nitrogênio das árvores leguminosas.
Agora, vamos lá. Para que eu possa tirar proveito dessa quantidade de nutrientes que está na copa, eu tenho que podar. Para eu tirar proveito da entrada de luz que o café precisa, eu tenho que podar. Mas minha poda não precisa ser uma poda que danifique a árvore. Eu posso fazer uma poda estruturada, que entra luz, eu posso incorporar matéria orgânica e a árvore se mantém viva. E a gente tem um benefício: o solo se recupera melhor e o café se nutre melhor.
Então, a gente precisa aprender como desenhar para tirar proveito dessa particularidade que está na copa e nas raízes leguminosas. O que a senhora viveu de se emocionar com as árvores leguminosas? Aconteceu que muitos produtores que estabeleceram seus sistemas agroflorestais fizeram distâncias muito próximas entre as árvores. Então, a oito metros ou outros madeiráveis.
Então, quando as árvores tiveram seis anos, fechou o café. Aí a gente chegou — o senhor se lembra, a senhora se lembra — que o acordo era que, quando crescesse, eu tiraria a metade das árvores para a luz entrar. Eu incorporo ali... "Ai, mas me deu pena... estão tão bonitas as árvores, que eu já deixei de olhar para o café e estou olhando para as árvores."
Então, eu disse isso e vim: vamos analisar a conversa. Se o senhor está emocionado e a senhora está emocionada com essa floresta, e não precisa de dinheiro, não precisa da produção de café, deixa. Vai sair uma produção de café, sempre vai produzir alguma coisa, e deixa.
Aí o pior é que está baixando a produção do café. Diz: "Olha, então tome a decisão rápida." Então, essa decisão é muito importante, porque tem que combinar um desenho que me permita produzir café em uma quantidade como um produtor correto.
Então, eu preciso do sagrado da existência da luz que está em frente. Se eu não fizer isso, reduz a produção do café. Por quê? Porque não tem a luz suficiente para dinamizar.
Inclusive, o produtor dizia: "Mas meu café está tão bonito!" Eu digo: "Claro! Ele está feliz da vida, porque ele não tem que parir cem filhos! Não tem que produzir muito. Toda a energia dele vai para fora." Então, a planta fica bem bonita, bem folhudona, mas a produção do café vai lá para baixo.
Porque não tem a luz suficiente para estimular a floração. Então, é esse jogo que a gente tem que fazer para ter um bom desenho. E o que o Marcelo disse: começar por um sistema de baixo risco. Inclusive, você não teve impacto na produção ainda, não viu impacto negativo, não é isso?
Agora ele está nessa fase, acho que tem que começar a pensar em podar e diminuir. Então, depois de seis anos, ele já está vendo — estou vendo aí muita copa próxima uma da outra. Esse indicador é muito importante: a copa das madeiráveis, quando começa a tocar, significa que vai haver um excesso de sombra. Então, eu preciso pensar se eu não tenho que eliminar uma árvore por meio, ou se eu não tenho que fazer poda, ou tenho que fazer alguma coisa. A gente precisa caminhar.
Aí vocês continuam com as perguntas no campo, o Marcelo também vai poder falar. Eu só queria fechar aqui, antes da gente ir, primeiro agradecendo ao Marcelo pela fazenda. A gente sempre está com essa fazenda aberta, maravilhosa. Todo mundo fala que é longe, mas eu tenho certeza que quem está aqui não se arrepende.
Eu só queria passar rapidinho, cinco minutinhos, para cada um falar o nome, de onde está vindo e, se puder, falar uma palavra sobre o que achou desse momento. Só para a gente se organizar, então fica mais fácil para a gente voltar depois.
Eu poderia começar por mim, e depois a gente segue aqui.
— Eu sou a Fabiane sou secretária-executiva do Consórcio Cerrado das Águas, e esse momento aqui me traz esperança. — Sou Marcelo Cabo, da Fazenda dos Meninos, do Consórcio Cerrado das Águas, e para mim é um momento de troca de experiências. — Meu nome é Hugo, sou de Pedrozinho, e esse momento aqui para mim é a minha aprendizagem. — Meu nome é Leonardo, Leitor, sou da Fazenda Reserva e Leitor. A palavra aqui é passar para frente. — Meu nome é Lúcia, sou de Patrocínio, da propriedade da Marta, e a minha palavra aqui é também esperança. — Meu nome é Patrícia, sou de Patrocínio, da propriedade da Marta. A ideia é construir com qualidade e preservação, que essa caminhada continue se produzindo. — Bom dia, meu nome é Isabel, sou de Fábrica Capano, e a minha palavra é otimismo, possibilidade e certeza pela fé. Unidade. — Bom dia a todos, meu nome é Pedro, e eu sou de Lúcia, da propriedade da Marta. E a minha palavra é otimismo, possibilidade e certeza pela fé. — Bom dia a todos, meu nome é Flávio, eu sou de Estoura do Memórias e trabalho constantemente nas cidades da gente. A minha palavra aqui é exploração. Estou buscando um pouco mais de conhecimento, e a minha palavra é exploração. — Bom dia, meu nome é Karen, eu sou de Espresso, e a minha palavra é conhecimento. — Meu nome é Carla, eu sou de Patrocínio, e o meu sentimento nesse evento é oportunidade. — Bom dia, eu sou de Patrocínio, advogado da FAM, e o objetivo hoje é entregar conhecimento. — Bom dia a todos, eu sou Rogério, produtor rural, e minha palavra é perseverança. — Bom dia, eu sou o FAM, produtor rural, faço parte da Universidade para Você e do Patrocínio. A minha palavra é dedicação, e meu trabalho na secretaria de agricultura é levar inovação para o nosso povo. — Bom dia, meu nome é Carla, represento o PATEM, e a palavra de ordem é compromisso com o patrocínio. — Bom dia, meu nome é Karen, sou uma das propositores e organizadoras, e minha palavra é organização. — Bom dia, eu sou o Gabriel, sou agrônomo pelo programa No Expresso, e a minha palavra é consciência. — Bom dia, eu sou a Dami, sou dos bons de mercado do Rio Aberto Brasil, e a palavra de hoje é conhecimento. — Bom dia, meu nome é Reis, sou postulante do Rio Aberto Brasil, e a palavra de hoje é esperança, soberania, agricultura e sustentabilidade. — Bom dia, meu nome é Danilo, sou de Palomar Del, sou agrônomo, agricultor familiar e também pretendo investir numa parte sustentável. A palavra de hoje é sustentabilidade. — Bom dia, eu sou Elias, educador da Costa Rica, e a palavra é colaboração – compartilhar nossas experiências locais e trazer informação útil para o Brasil. — Bom dia, meu nome é Letícia, faço parte da equipe do Consórcio Cerrado das Águas, e a palavra de hoje é possibilidades. — Eu sou Mariana, bióloga do Consórcio Cerrado das Águas, e a palavra é conexão. — Eu sou Poliana, assessora de comunicação do Consórcio Cerrado das Águas, e a palavra de hoje é transformação. — Bom dia, eu sou Rafael, aluno do Consórcio Cerrado das Águas. Duas palavras: boas perspectivas.









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