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Curso Compostagem Tropical

Atualizado: 13 de ago.

O Curso de Compostagem Tropical é Solução Viável e Lucrativa para fazenda

Você sabia que os resíduos orgânicos da sua fazenda podem se transformar em um insumo de alto valor agronômico e econômico por meio de compostagem?

No evento realizado no dia 16 de julho de 2025, na Fazenda 5 Estrelas, em Patrocínio-MG, mergulhamos nas práticas e nos benefícios da compostagem tropical orgânica sob o olhar da agricultura tropical.

Palestrante Antonio da Silva Teixeira ministrando a Curso de compostagem Tropical
Palestrante Antonio da Silva Teixeira ministrando a Curso de compostagem Tropical

Com participação de especialistas e agricultores, discutimos como a compostagem pode:

  • Reduzir custos de produção;

  • Melhorar a saúde e a fertilidade do solo;

  • Aumentar a resiliência das propriedades diante das mudanças climáticas;

  • Ser uma ferramenta de transição para uma agricultura regenerativa.

As experiências e evidências científicas compartilhadas mostram que a transição para modelos produtivos arborizados, com menor uso de insumos químicos, pode gerar ganhos ambientais, sociais e econômicos para os produtores.

Acompanhe a transcrição completa e conheça os detalhes dessa técnica sustentável. Se preferir, você também pode ouvir o conteúdo completo no Spotify.



Transcrição

É muito importante esse trabalho. Uma frase forte que eu queria falar é a seguinte: se você, produtor, não cuida do seu solo, não cuida das suas águas, então você não gosta dos seus filhos, não gosta dos seus netos. Porque, depois que você morrer – e eu sei que é forte isso –, eu, que tenho cinco filhos e nove netos, trabalho por eles. Eu podia estar aposentado já, sou um dinossauro que a árvore não gosta. Mas trabalhar pelas águas e pelo solo é gostar das futuras gerações. Então é muito importante, parabéns mais uma vez. Eu já virei fã desse trabalho.

Comecei a viajar muito, então tive que abandonar essas atividades e dedicar-me exclusivamente à consultoria e à agricultura. E aí, vou chamar de regenerativo, pelo nome da moda hoje, mas sempre fiz a mesma coisa: agricultura conservacionista. Depois virou agroecológica, aí pegaram a ciência da agroecologia e deturparam o termo para movimentos sociais e políticos, que também são vazios. Hoje, você não pode falar numa propriedade que pratica agroecologia, porque vão achar que você está querendo tomar a terra desse jeito.

Mas agroecologia é nada mais, nada menos do que uma agronomia ecológica, o estudo dos agroecossistemas. É uma agronomia que não se resume a receitas de bolo, que só interessam aos fabricantes de insumos. É uma agronomia que entende a propriedade, o time da fazenda, e aí sim chama os fornecedores de insumos para fazer um projeto personalizado. Uma agronomia mais inteligente.

Então, quando a gente criou a Libertas, há 17 anos, foi simplesmente para colocar em prática o que a gente estava fazendo na faculdade, tanto em grandes propriedades quanto em pequenas propriedades. E é o que a gente vem fazendo até hoje. Parece que está dando certo, porque, naquela época, era só eu sozinho. Eu vim aqui, não sei quantos anos atrás, dar assistência técnica para o senhor José Carlos Grossi. O Fernando trabalhava para ele, e eu me lembro de uma vez em que o senhor José Carlos queria fazer uma compostagem só com a casca do café.

Eu falei: "José Carlos, só com a casca do café? Não vai dar certo". Ele perguntou: "Por quê?" E eu respondi: "Por causa da dimensão física. Para a gente fazer uma receita de compostagem hoje, são seis dimensões que precisamos sentar e analisar: a física, a química, a biológica, a operacional, a financeira e a agronômica. Só assim eu posso fazer uma receita de composto, José Carlos."

Composto orgânico é outra palavra que precisamos aproximar um pouco aqui. Composto orgânico não é só pegar o composto e jogar para lá e para cá. Você pode fazer um adubo maravilhoso, como essa fazenda aqui faz. Há quantos anos, Fernando? Sete anos? Sete anos!

Está aqui também o Fernandinho, o Felipe, o Pedro… todos fazem parte da nossa equipe, da equipe do Fernando, e estão no dia a dia desse processo de ensinar o produtor a fazer compostagem.

Então, o José Carlos falou: "Não, eu quero uma leira só com o Freitas, está aqui, novo parceiro. Eu quero uma leira só com palha de café." Eu falei: "A dimensão física diz que não dá certo." Ele respondeu: "Eu quero."

Tá bom, eu disse, vou fazer uma leirinha pequena aqui, meu Fernandinho, só para absorver. Fizemos a leira, e o segundo passo foi colocar 50% de umidade nessa leira. Aí jogava água por cima, a água escorria por baixo. Eu disse: "Agora você entendeu? Compra um pouquinho de esterco, pelo amor de Deus, senão não vai dar liga."

Isso é só para dar um exemplo de como o Felipe começou a estudar e levar a sério essa questão da compostagem. "Olha, por onde eu passo aqui?" "Isso." "Aqui?" "Isso." "E passar sem ver? Vocês estão enxergando alguma coisa aí?"

Então, dentro dessa história, eu passei esses dias lá na Fazula. Lá no chão tem uma placa com o meu nome, que foi da quarta turma de Agronomia da Fazula. Desde a segunda turma eu já estava lá.

Eles colocaram essa placa e plantaram um pé de jequitibá, que é esse jequitibá aqui, que está lá na entrada da Fazula. Esse jequitibá já tem 30 anos, está grandão agora.

E, nessa época, eu estava ensinando agroecologia. Acho que eu fui o primeiro professor de agroecologia de Minas Gerais, lá na Fazula. Foi um dos motivos que me levaram a pedir demissão da Fazula para, depois, abrir a empresa de consultoria.

Uma vez, um aluno falou para mim que a minha aula era maravilhosa, que era a melhor aula da faculdade. Eu me enchi todo, fiquei todo pavão, e perguntei: "Por que você acha essa aula tão boa?" Ele respondeu: "Porque parece um filme, parece um cinema, parece..."

Eu falei: "É maravilhoso, como é que é isso?" Ele completou: "Sexta-feira a gente tem que ir para a fazenda, e o bicho pega. É veneno na veia mesmo, é adubo químico, mete o arado na terra, porque a gente tem que ganhar dinheiro."

Naquele dia, eu fui do céu ao inferno em menos de dois minutos. Perdi até o rumo de casa. Eu percebi que, para os alunos, a minha aula era um cinema, algo que não poderia ser aprendido na realidade, porque a realidade era dura. Se fosse como na aula, seria o paraíso, mas não era.

Cheguei em casa naquele dia, e minha mulher olhou para mim e perguntou: "O que você tem?"

Eu falei: "Nem eu sei." Fui dormir às 7 horas da noite e, naquele dia, acho que foi o dia em que mais dormi na minha vida. Dormi umas tantas horas. No dia seguinte, eu levantei e minha mulher ficou me olhando, reparando até na minha respiração. Ela pensou: "O que é que aconteceu com esse homem?"

Eu olhei para ela e falei: "Vou pedir demissão da faculdade." Ela respondeu: "Você ficou doido?" Eu disse: "Fiquei." Peguei o carro, fui até lá e pedi demissão da faculdade.

Claro que continuei dando as aulas até o final do semestre, mas resolvi que o meu desafio, então, seria provar que aquele "cinema" poderia ser uma verdade. Ou então, eu rasgaria tudo de novo.

Então, durante toda a minha vida, eu tive a oportunidade de caminhar numa estrada paralela à agricultura convencional. Por isso, me sinto muito à vontade para falar sobre esse assunto, porque foi o que eu fiz a vida inteira.

Parece que estamos no caminho certo, porque antes era só eu, e hoje nós somos 30 pessoas na Libertas, atendendo 180 propriedades. Eu fico muito feliz, porque tenho até alguns clientes que já nos deixaram, mas não largaram a prática da compostagem.

Essa é a mensagem que eu queria passar primeiro aqui para os produtores, porque eu acho que ela é muito mais importante do que saber quantas conchas disso ou quantas conchas daquilo. É importante entender o seguinte: se você quiser fazer compostagem, nós já trilhamos esse caminho. Dá certo, mas a compostagem precisa ser bem feita, porque, se for mal feita, é melhor nem fazer.

Então, se eu colocar aqui uma leira de composto bem feita, com uma fermentação de qualidade superior, e do lado de cá eu colocar outra de qualidade inferior, você não vai saber qual é uma e qual é a outra. A não ser que você cheire, porque a de qualidade inferior vai estar fedendo. Mas, apenas olhando, você não sabe diferenciar.

Se você fizer uma análise química para ver quanto tem de NPK, também não vai saber qual é a boa e qual é a ruim. Por quê? Porque nós estamos falando de fermentação microbiana.

Os exemplos estão aí, vocês conhecem: para fazer um queijo, para fazer um pão, para fazer uma cerveja, para fazer um vinho... tudo isso são fermentações. A mesma coisa vale para fazer uma silagem. E você sabe quando a silagem estragou, não é?

E o que é estragar? É uma fermentação de qualidade inferior.

E por que estragou? Porque as condições não foram adequadas para que crescessem as bactérias que interessam hoje. Aí eu vou fazer uma coalhada, vou pegar a isca do fulano, que é a melhor que tem, e a coalhada fica docinha, uma maravilha.

Agora, se eu pegar um copo de leite e deixar do lado de fora, aqui, por uma semana, vai ficar uma coalhada azeda, ruim. Não é isso?

Você quer ver a própria silagem? Quem faz silagem aqui? Alguém? Então, vamos lá. Você vai lá, corta o capim. Você vê o capim? Vai lá, corta, e quando você tem a siladeira, já injeta ali uma bactéria, provavelmente uma bactéria láctica.

Você corta o capim, tem que ter o tamanho certo, depois precisa acondicionar esse material no local adequado, que é o silo. Você tem que apertar, tem que molhar, tem que tampar, tem que fazer tudo de um jeito que favoreça as bactérias, porque elas estão aí no ar, nós estamos respirando elas. Você precisa fazer tudo da maneira certa para preservar a qualidade nutricional daquele capim.

Então, você tem bactérias que vão gerar, por exemplo, uma fermentação putrefativa, e tem bactérias que vão gerar um material de excelente qualidade, para o animal comer depois.

Agora, por que você tem que ter todo esse trabalho? Era só cortar o capim e largar o monte lá, chegar na época da seca e dar para as vacas. Mas faz isso para você ver: corta um monte de capim, deixa lá no tempo... O que vai acontecer? Enfia a mão lá dentro e cheira. Está fedendo, não é? A vaca nem vai querer isso, não vai alimentar ela de verdade.

Então, esquece a vaca e pensa nos micro-organismos do solo, nos fungos e nas bactérias, que são o motor do solo. É isso que faz o solo funcionar e levar alimento para a planta.

Estamos aqui quebrando um paradigma, o de que a planta é um paciente de hospital, tomando soro — tanto de fósforo, potássio, cálcio, magnésio — porque, se o solo é morto mesmo, vamos dar um soro para ela, que assim vai produzir, vai ficar "gordinha", coradinha, ali no soro.

Só que, desse jeito, ela engorda, ela produz, mas não tem saúde. E aí vem praga, vem doença, precisa matar isso, matar aquilo... e o custo começa a correr atrás do preço do café.

Aí o café sobe de preço, começa a comprar as coisas. O café cai de preço, o café começa a dar prejuízo. E a gente vive esse ciclo há quantos anos? Quantas vezes? Tudo isso porque desprezamos as propriedades naturais do solo que Deus fez para nós.

Naquela matinha lá, não precisa adubar, não precisa jogar veneno, não precisa fazer nada. Está tudo sob controle.

Então, nesse sentido, eu quero mostrar uma foto para vocês. Estão vendo aí? Mais ou menos, né? Vamos lá. Eu quero mostrar que, do lado de cá, tem uma mata. Certo? E do lado de cá da estrada, tem uma lavoura. Parece que é sorte.

Mas não é. De um lado, você tem um ecossistema com mata. Do outro lado, você tem um “árvorecossistema”, que tirou a mata para plantar uma lavoura — podia ser café, podia ser qualquer outra coisa.

E qual é a característica de um “árvorecossistema”? Diversidade biológica, diversidade de espécies.

Tem planta aqui de todo tipo, obviamente tem animal de todo tipo. E, debaixo da terra, onde a planta libera os carboidratos — ou parte dos carboidratos que ela fabrica através da fotossíntese — ela libera para alimentar a vida do solo.

Por que ela faz isso? Ela é boazinha? Gente, é só pensar um pouquinho: até uma bactéria consegue nadar atrás do alimento. Qualquer ser vivo sabe nadar, voar ou andar para correr atrás de um alimento. E o alimento é alguma coisa feita de carboidrato. Obrigado.

O carbono é um nutriente da vida. Nós somos estruturas de carbono, todos os animais são. Então, isso que eu estou falando é viagem na maionese? Pode até parecer, mas nós vamos fazer a conexão lá com o seu negócio.

Nós estamos falando de leis naturais. Não estamos falando de nada que eu inventei, nada que o Fernando inventou. Estamos falando de leis naturais. O ciclo do carbono você aprende lá no colégio. Depois, eu nem sei se na faculdade ainda ensinam o ciclo do carbono. E ele é o ciclo da vida. Não tem nada mais importante aqui.

O ciclo do carbono mostra que as plantas têm essas “placas solares”, que são as folhas, que absorvem a luz do sol. Elas têm uns furinhos minúsculos na folha chamados estômatos, que absorvem o CO₂ durante o dia. E com esses três elementos — luz do sol, CO₂ e água puxada pelas raízes — elas fazem a fotossíntese. Conseguem transformar luz, energia, calor em carboidrato para o corpo delas e para alimentar toda a biologia do solo.

Porque a planta não consegue correr, não consegue andar, não consegue nadar, não consegue voar. Então, como ela poderá, dentro do solo, buscar o “temperinho” que falta, que são os elementos minerais?

Tudo na planta é carbono, hidrogênio e oxigênio, que ela pega do ar, da água, do sol. Mas existe uma partezinha bem pequena, cerca de 4%, que é hidrogênio, fósforo, potássio, cálcio, magnésio, enxofre, boro e por aí vai. E aquilo que a gente acha que é o alimento da planta, na verdade, é só o tempero. Precisa dele? Precisa. Mas é como o sal: comer sem sal é ruim, mas salgado demais também é ruim.

Então, a partir de hoje, vamos pensar no adubo como tempero. E tempero não pode ser nem para mais, nem para menos. O excesso de adubo não enriquece o solo; excesso de adubo é burrice. E a falta de adubo também é burrice. Nós podemos fazer adubo na fazenda e, se faltar alguma coisa, a gente vai lá na cooperativa, vai na loja e compra.

Muito bem. Então, aqui nesse “árvorecossistema”, nós temos fragilidade. Por quê? Porque tem uma cultura só. E aqui, nós temos resiliência, fortaleza. Aqui, choveu ou não choveu, está verde. Não dá doença, não dá praga, está produzindo biomassa por causa da biodiversidade. A biodiversidade é uma lei natural. Diversidade é sinônimo de fortaleza.

Isso serve para tudo, até para nós. Quer ver? Onde todo mundo pensa igual, ninguém está realmente pensando.

Hoje, estamos vivendo um modismo de dualidades. É oito ou oitocentos? É homem contra mulher? É branco contra preto? É “esse lado” contra “aquele lado”? Isso é uma dualidade burra.

O inteligente é fazer como o Fabiano: “Eu não quero nem saber, vamos pra frente, vamos fazer acontecer”. Eu não sou de esquerda, não sou de direita, eu sou pra frente. Conviver com as diferenças é o que nos fortalece enquanto sociedade.

E o mesmo acontece aqui. A biodiversidade traz fortaleza para o sistema. Mas a gente precisa plantar café, precisa plantar milho, então acabamos criando um sistema frágil.

E aí entra a melhor definição que eu conheço de agricultura regenerativa tropical. Tem que colocar “tropical” no meio dessa história, porque senão vêm os europeus, os japoneses ou os americanos dizer o que é agricultura regenerativa e até preencher formulário dizendo o que estamos fazendo aqui. Mas o que eles entendem de solo tropical? Quem entende somos nós.

Por isso, sempre que falarem em agricultura regenerativa, falem “agricultura regenerativa tropical”. Assim, trazemos para nós essa responsabilidade. Faz sentido? Eu preciso produzir, mas também preciso encontrar caminhos para copiar as leis naturais que funcionam na natureza e aplicá-las do lado de cá, no nosso sistema produtivo.

Eu preciso trazer essa fragilidade, essa monocultura, para o outro lado, colocando espécies diferentes na minha lavoura, seja no tempo ou no espaço, para fazer meu solo ficar vivo novamente, fazendo a biologia do solo voltar a atender a planta.

A planta é o maestro. Ela se comunica pela raiz. Pela raiz, ela sente o que está acontecendo. Se está faltando fósforo, por exemplo, ela “pensa”: “Estou precisando de fósforo para crescer”.

Isso que eu estou dizendo aqui, gente, não é invenção da minha cabeça. Eu falo desse jeito, de forma simples, mas existem vários trabalhos científicos comprovando isso. Eu poderia mostrar um monte de artigos agora, mas prefiro explicar dessa forma.

Então, quando a planta percebe que está precisando de fósforo, ela libera carboidratos chamados exsudatos radiculares pela raiz. É como se fosse uma comidinha que atrai aqueles micro-organismos – fungos, bactérias – que são capazes de buscar o fósforo para ela.

Por exemplo, os fungos micorrízicos. No caso do café, a planta permite que esses fungos entrem na raiz e se estabeleçam numa estrutura chamada arbusco. A partir daí, eles emitem um filamento, um tipo de raizinha muito mais fina, quase invisível, que consegue ir lá onde a raiz normal nunca alcançaria, localizar o fósforo e liberar ácidos para solubilizá-lo, trazendo esse nutriente para a planta que está fixado no solo. A planta libera o fósforo, traz ele junto com a água por dentro dessa “teiazinha de aranha” formada pelos fungos micorrízicos, e esse nutriente vai para dentro da planta, fornecendo o fósforo que ela precisa para crescer.

Existem estudos mostrando que o café chega a gastar até 20% de toda a energia que ele produz para alimentar esses micro-organismos. Vinte por cento! E na natureza não existe almoço de graça. Se a planta investe 20% da sua energia nesses parceiros invisíveis, é porque eles são realmente importantes.

Por isso, a coisa mais importante que podemos fazer por um solo é deixá-lo vivo, cheio de vida, capaz de sustentar essas interações naturais.

Na agronomia, o nosso papel é esse: levantar dados sobre o que estamos fazendo, entender o sistema, gerar um diagnóstico, propor um modelo novo, monitorar, medir, ajustar e evoluir. Essa roda é que move uma agricultura saudável. Não existe milagre, não existe produto milagroso, não existe bala de prata. Essa história de “esse produto vai te dar 10 sacas a mais de café” não funciona assim.

E antes de encerrar, eu quero fazer uma homenagem a esse homem aqui – um homem destemido, corajoso, que enfrenta os desafios de cabeça erguida, que ama o que faz. Que Deus abençoe sua caminhada, que ele vença mais essa dificuldade que está enfrentando hoje. Graças a ele, nós estamos aqui, nessa fazenda que só melhora a cada dia. Ele é um exemplo para todos nós Condutor corajoso. A primeira vez que eu vim aqui, lembro bem: o Gustavo Neto, o Fernando também… aquelas ruas de café estavam verdes, mas o chão já tinha até um lodinho. A água não penetrava mais no solo. E a gente lá, jogando produto, aplicando floreno, porque todo mundo fala: “matéria orgânica é bom, matéria orgânica é bom”.

Mas, gente, tudo tem um jeito certo de ser feito. Matéria orgânica é um termo muito amplo. Igual o exemplo da silagem: um capim estragado é matéria orgânica, mas não serve para alimentar direito o gado. Uma silagem bem feita, de qualidade, também é matéria orgânica. O mesmo vale para compostagem: uma mal feita é matéria orgânica, mas não vai trazer benefício; uma bem feita é matéria orgânica que vai transformar seu solo.

Ou seja, só falar “matéria orgânica” não resolve nada. A diferença está em fazer uma boa gestão dessa matéria orgânica, trabalhar ela em parceria com os micro-organismos, com as plantas.

Olha que beleza foi aqui: fizemos o mix de florada, ajudamos ele na época – eu e o Fernando – a escolher as espécies certas, e o café virou outra coisa. Mudou o sistema.

Essas práticas, quando são combinadas dentro de uma lógica inteligente, com visão sistêmica do negócio, funcionam. Muita gente, no passado, se frustrou com a agricultura orgânica porque achava que era apenas uma lista de proibições: “não pode isso, não pode aquilo”. E aí o produtor pensava: “poxa, mas então o que é que eu posso fazer?”.

Aqui é diferente: é sobre entender o sistema, manejar bem os recursos, trabalhar com a natureza e não contra ela.

Esse exercício de simplesmente trocar um produto por outro não resolve. Não adianta dizer: “agora é água de fumo”, “esse adubo aqui não pode mais”, “vamos usar torta de mamona”. Isso é só substituir um insumo por outro. O caminho é outro.

A compostagem, sim, é uma bela porta de entrada para mudar a cara da propriedade. Mas ela é só o começo. Se ficar só nisso, não vai transformar de verdade o sistema.

Olhem essa imagem aí, essa área da fazenda que eu tomei emprestada do seu pai para usar nos slides. Eu queria mostrar uma coisa simples: toda a energia do nosso planeta vem do sol.

E tudo que nos mantém vivos vem dessa energia. Pode ser vegetal, pode ser um animal que comeu um vegetal, ou até um animal que comeu outro animal que se alimentou de vegetal. A única exceção é o sal que vai no nosso prato, que é mineral. O resto, tudo vem das plantas.

Por quê? Porque são elas que têm a capacidade única de capturar a luz do sol e transformá-la em energia para a vida. São os vegetais que movem todo o planeta.

Isso não é invenção de empresa nenhuma, não é modismo. É lei natural, criada por Deus. Está aí desde sempre.

Agora, sabendo disso, pense: se você tem uma linha de café e entre as linhas só existe rua pelada, solo exposto, aquele chão onde aparece a terra nua, o que você está fazendo? Está desperdiçando a energia que o sol está entregando de graça todo dia.

Agora me diz: essa rua pelada, entre as linhas de café, está fazendo fotossíntese ou não? Não está. E a linha de café, está fazendo fotossíntese? Está.

Então, se a gente pensar que a lavoura é uma fábrica de energia, o que temos aí? Uma fábrica com metade do galpão funcionando e a outra metade em greve. Produzindo só 50% da capacidade.

Agora, quando você olha para a área e vê tudo verde, sem solo exposto, aí sim você tem 100% da lavoura captando energia do sol e devolvendo isso para a terra. Faz sentido?

Mas espera aí, não acabou a história. A braquiária cresceu, está bonita, está alta… mas ainda não é café, não virou matéria orgânica ainda, está só ali. Aí você passa a roçadeira, a trincha, derruba tudo pro lado do café. Virou adubo? Ainda não.

Ela fez uma função importante, protegeu o solo, manteve a vida ali, mas não aumentou a matéria orgânica ainda. Quer ver um exemplo? Vai numa lavoura de cana depois que a colhedora passa. A quantidade de massa que fica no chão é enorme. Mas vai perguntar na usina se isso está aumentando matéria orgânica no solo. Não está.

Mesmo em áreas de cana colhidas há 30 anos, a matéria orgânica é a mesma. Por quê? Porque para a matéria orgânica do solo aumentar, o carbono precisa ficar mais tempo dentro do solo, não apenas ser cortado e jogado por cima.

E aí, quando a gente deixa aquela palha da cana no chão, o que acontece? Começa a chover, pega sol, vento… e por baixo, não tem micro-organismo para decompor aquilo, para fermentar, para transformar em matéria orgânica de verdade. A palha vai virando um pozinho, seca, e o carbono que estava ali se perde. O CO₂ que veio do ar, entrou na planta, virou folha, passou pela colhedora… fica no chão, mas não entra no solo. O que acontece? Ele volta para a atmosfera. É como se fosse um aborto do carbono, ele não completa o ciclo.

E por que isso acontece? Porque faltou vida no solo. E por que não tem vida ali? Porque aquele ambiente da cana está cheio de resíduos químicos, herbicidas, monocultura pesada… é difícil para os micro-organismos sobreviverem naquele solo.

Então, o que a gente precisa fazer? Primeiro, a braquiária no meio do café é excelente. Mas, quando a gente corta ela e joga para o pé do café, tem que ter os bichinhos lá embaixo, os micro-organismos prontos para trabalhar. Aí sim a energia que veio do sol, passou pela braquiária, vira café de verdade, alimenta a planta.

É assim que funciona o ciclo do carbono dentro de uma lavoura de café:

O café faz biomassa.

A braquiária faz biomassa.

E o solo precisa estar cheio de vida para transformar tudo isso em fertilidade.

E o que esses micro-organismos precisam para crescer dentro da sua lavoura, dentro do seu solo? Eles precisam de três coisas básicas, que são a chave para manter esse ciclo funcionando o ano inteiro.

E o que o micro-organismo precisa para viver no seu solo? Ele precisa de comida, precisa de água, precisa de ar para respirar e precisa de um ambiente limpo, desintoxicado. Se faltar qualquer uma dessas coisas, ele não vai crescer, não vai trabalhar para você.

É isso que a agricultura regenerativa faz: vai devolvendo vida para o solo, substituindo aos poucos aquele adubo químico altamente solúvel, agressivo, por soluções mais equilibradas e naturais. Coisas como compostagem bem feita, pós de rocha, remineralizadores, fertilizantes de liberação lenta, composto orgânico. Tudo isso ajuda a reativar a biologia do solo, a fazer ele voltar a respirar.

Agora, não adianta nada você ter biomassa e continuar jogando herbicida, herbicida, herbicida. Se a cada roçada você só aplica veneno, aquela massa se perde. O caminho é o contrário: herbicida no mínimo possível, e o máximo possível de roçadeira, trincha, cobertura verde. Não tem mistério. Vocês já sabem disso, mas é bom reforçar: as ações na fazenda precisam estar integradas, conversando entre si.

E quando você começa a mudar a prática, a vida começa a voltar. Começam a aparecer os bichinhos de novo, a biologia toma conta. Você ainda vai precisar intervir – afinal, não é floresta, é lavoura –, mas o manejo fica muito mais fácil, equilibrado.

Aí entra outra coisa: Se você vai usar biológicos para praga ou doença, se vai montar uma biofábrica na fazenda, cuidado. Não é para sair fazendo de qualquer jeito. Busque orientação, consulte um especialista, contrate uma consultoria se puder. Porque esse mundo é cheio de detalhes, e às vezes a gente acha que está ajudando e acaba criando outro problema. Agricultura regenerativa é passo a passo, com conhecimento, estratégia e respeito às leis da natureza.

Às vezes, o produtor é bem-intencionado. Muitas vezes, até o funcionário quer ajudar, fazer o certo, mas está acostumado com o modelo antigo de agricultura: “deu problema, passa um veneno, mata tudo e vai descansar”. Com os biológicos, não é assim. Estamos lidando com vida, com organismos vivos, e vida é diferente. Tem hora que funciona, tem hora que não funciona, e ninguém costuma falar isso para você, mas é a realidade do campo. Há situações em que a aplicação não dá resultado, o produto se perde, precisa ser descartado. Outras vezes, tudo funciona perfeitamente e a biologia responde. É um processo de tentativa, aprendizado e ajuste contínuo.

Por isso, se a ideia é economizar de verdade com inseticida, não basta apenas reduzir o uso do produto. Uma parte desse recurso precisa ser investida em monitoramento da lavoura. É fundamental ter armadilhas, acompanhar o que está acontecendo, entender a dinâmica das pragas e dos inimigos naturais. Sem isso, é como dirigir no escuro, sem rumo certo. A evolução acontece aos poucos: dois passos para a frente, um passo para trás, sempre aprendendo com cada experiência.

Os resultados já são visíveis. Muitos produtores vêm reduzindo 50%, 70% do uso de veneno, e no caso dos fertilizantes químicos, alguns chegam a cortar 80%, até 100% do hidrossolúvel. Essa mudança não acontece do dia para a noite, exige paciência, observação e estratégia. A agricultura regenerativa não é milagre, é evolução. Cada Ana Primavera, que eu só pude conhecer através dos livros, me levou a refletir sobre o valor do conhecimento vivo, daquele que encontramos em pessoas que carregam experiências únicas. Nesse lugar, tive a oportunidade de acessar um saber profundo que muitos ainda desconhecem: o centro de pesquisa da Fundação Mokuchokada. Localizada em Ip1, no estado de São Paulo, próximo a Rio Claro, a fundação foi criada pela Igreja Messiânica, uma instituição japonesa que se estabeleceu no Brasil. O fundador, Mokuchokada, além de idealizar a igreja, também foi o criador da chamada agricultura natural, um conceito inovador que busca compreender a produção agrícola de forma harmônica com a vida do solo.

Na Fundação Mokuchokada, existe um entendimento profundo sobre a microbiologia do solo e sua importância para a agricultura. Lá, foi realizado um experimento simples, mas revelador, que em apenas dois slides demonstra como os micro-organismos do solo são fundamentais para o desenvolvimento das plantas. No primeiro caso, o solo utilizado passou pela autoclave, ou seja, foi esterilizado, eliminando tudo o que era vivo nele. Em seguida, foram plantadas sementes de feijão nos recipientes. Após alguns dias, registrou-se o resultado.

No segundo caso, o mesmo procedimento foi realizado, com o mesmo solo, as mesmas sementes de feijão e no mesmo período de tempo. A única diferença é que, dessa vez, o solo não foi esterilizado, permanecendo vivo, com sua microbiota ativa. O resultado é visível: a diferença no desenvolvimento do feijão é clara e incontestável, comprovando que a vida do solo é um fator essencial para a saúde e o vigor das plantas.

 decisão na lavoura precisa ser acompanhada de um olhar atento, dados concretos e entendimento do sistema, construindo, pouco a pouco, um caminho mais inteligente e sustentável para produzir.

Vou voltar ao ponto principal. Embora aqui esteja claro, em um ambiente mais escuro a diferença é gritante, é como da água para o vinho. O que causou essa diferença? Apenas a vida do solo. Depois de ver esses dois exemplos, para que eu precisaria apresentar inúmeros artigos científicos para provar que a biologia do solo é importante? Isso já está evidente. Os solos tropicais se tornam mais férteis não quando simplesmente adicionamos mais água, mas quando proporcionamos condições para o pleno desenvolvimento e diversidade dos organismos que vivem nele – macro, meso e microfauna.

Por isso, quando amanhã aparecer um vendedor na sua fazenda oferecendo um produto milagroso, é preciso pensar com cuidado. Vou dar um exemplo que gosto muito de citar: um produto que promete corrigir o pH do solo em 24 horas. A propaganda diz que basta aplicar uma tonelada por hectare hoje e amanhã o solo estará corrigido, dispensando o uso de calcário. O nome do produto é “Max Turbo Cruz, Top de Segunda Geração”. Você olha aquilo e pensa: "Isso deve ser realmente bom!". Compra o produto, aplica na lavoura e, ao virar o saquinho, percebe que é apenas cálcio, muito cálcio e magnésio. Ao colocar em um copo com água, o pH salta de 5 para 7 em dois minutos. Mas é preciso aprender a pensar de forma crítica, como uma criança curiosa que questiona tudo, para não se deixar levar por soluções milagrosas que ignoram a verdadeira lógica da fertilidade do solo: a vida que existe nele.

É como se existisse uma bateria dentro do solo, permitindo que os organismos consigam viver em um pH de 5 a 5,5. Por isso, se colocamos uma tonelada de cal, não estamos corrigindo o solo de forma natural, apenas criando um efeito imediato. Afinal, o cal é usado até mesmo para esterilizar, como acontece em camas de frango. Isso mostra que a aplicação de cálcio, nesse contexto, é mais para eliminar vida do que para melhorar o solo.

Esse exemplo reforça um ponto importante: não precisamos recorrer constantemente a protocolos de adubos hidrossolúveis, a não ser em situações de emergência ou casos muito específicos, que veremos mais adiante. O foco da agricultura tropical deve ser outro. Primeiramente, cuidar da vida do solo, já que ficou evidente a importância de manter um solo vivo e ativo biologicamente.

Outra prática essencial é substituir o uso excessivo de produtos químicos – seja agrotóxicos, defensivos ou qualquer outro nome que se queira dar – por alternativas mais seguras e equilibradas, sempre dentro de um programa técnico bem acompanhado. É preciso cautela, pois intervenções mal planejadas podem prejudicar todo o sistema biológico do solo.

Além disso, a diversidade, tanto temporal quanto espacial, é fundamental. Uma lavoura de café com uma única espécie não é um sistema completo. Quanto mais espécies puderem ser integradas, seja entre as ruas do café ou no entorno da plantação, melhor será o equilíbrio ecológico. E não se iluda: sem diversidade, o sistema se fragiliza, e em 20 anos a lavoura pode enfrentar sérios problemas de sustentabilidade e produtividade.

No sistema agroflorestal, não há dúvida: vocês estarão plantando árvores por toda parte, pois são cuidadores daquele espaço que pertence a vocês, à sua família, ao seu pai, ao seu avô, registrado na escritura da terra. Mais do que proprietários, vocês são responsáveis por cuidar dessa terra, e a forma que a sociedade encontrou para remunerar esse cuidado é comprando o café que vocês produzem. Pensem por esse lado: o verdadeiro negócio de vocês não é apenas produzir café, mas cuidar da fazenda, do solo, das águas e de toda a vida que existe ali. A venda do café é a consequência desse cuidado, e o mercado tende a valorizar cada vez mais quem preserva melhor a paisagem e o ambiente.

É por isso que falamos sobre essas práticas agora: o cenário está mudando e o futuro da produção está diretamente ligado à conservação. A fitomassa, por exemplo, já foi explicada: quando a braquiária morre, para virar fertilidade para o café, precisa da ação dos micro-organismos. O ciclo da vida é assim: acima do solo, a fotossíntese; abaixo do solo, a decomposição da matéria orgânica pelos micro-organismos. Esse é o motor que mantém a lavoura viva e produtiva.

Não existe como acelerar apenas a parte aérea da planta, sem acelerar também a decomposição no solo. Se tentar fazer isso de forma artificial, forçando um lado do ciclo, a consequência é a perda da vitalidade do sistema. A aceleração precisa ser equilibrada e respeitar a lógica da natureza: tudo funciona em harmonia, e qualquer atalho pode comprometer o resultado final.

Esse produto promete derreter a braquiária, mas, logo depois, a planta volta a crescer. A agricultura tropical funciona como um fluxo constante, não é estoque, nada parado. Tudo é entrada e saída. Quanto mais massa verde existir na lavoura, quanto mais micro-organismos estiverem ativos no solo, mais vivo será o sistema produtivo. A vida é movimento, assim como nós, que precisamos nos manter ativos para não definhar. No campo, o princípio é o mesmo: a vitalidade depende desse ciclo dinâmico de produção e decomposição.

Hoje, fala-se muito em crédito de carbono, na busca por formas de fazer com que o carbono fique preso no solo e não volte para a atmosfera. Porém, é preciso ter cuidado com soluções aparentemente milagrosas que surgem por aí. Um exemplo é a proposta de pegar a palha do café e enviar para uma empresa que promete carbonizá-la, transformando-a em biochar, aquela "terra preta" famosa da Amazônia, supostamente capaz de salvar o planeta.

Na prática, o processo é simples: a palha é retirada da lavoura, colocada numa pirólise, vira carvão e retorna ao produtor em forma de pó. O problema é que, nesse caminho, nada foi alimentado dentro do solo. Minhocas, besouros, larvas, fungos, bactérias, todos ficaram sem a matéria-prima para se desenvolver. A energia do sistema se perdeu no processo, transformada diretamente em carvão, sem passar pelo ciclo natural de vida e decomposição que realmente dá vitalidade à terra. Isso mostra que a pressa em encontrar soluções rápidas pode custar caro para a saúde do solo e para a sustentabilidade da lavoura.

Agora dizem: "esse carvão nunca mais vai sair daqui", e então vêm buscar seu crédito de carbono. Mas quando chega a hora de fazer as contas, você percebe que aquele "crédito" é 90% promessa e 10% realidade, lembrando o contrato que assinou sem ter a garantia do retorno.

Por isso, quando falamos em adubação regenerativa, é preciso ter critério. Usar rochas é uma excelente alternativa, mas sempre com base científica. Em muitas regiões há boas opções de rochas registradas no Ministério da Agricultura, finamente moídas, que podem ser aplicadas ao solo com ótimos resultados a médio e longo prazo. No entanto, elas não funcionam como uma solução imediata.

Se o solo está com deficiência severa de potássio e você tem uma produção de 90 sacas de café por hectare, não adianta retirar o cloreto de potássio de um dia para o outro e esperar que a rocha resolva tudo na próxima safra. Ela libera nutrientes de forma mais lenta, e o primeiro ano é um investimento. Aos poucos, você consegue reduzir o uso de cloreto, especialmente se combinar o uso das rochas com um bom composto orgânico. Essa "dobradinha" é fantástica para revitalizar o solo, mas exige paciência e manejo bem-feito.

E aqui vale um alerta importante: composto mal feito é pior do que não usar composto nenhum. Por isso, é preciso saber o que está sendo aplicado na lavoura e como ele foi produzido, para garantir que realmente traga benefícios e não problemas para o solo e para o café.

A minha sugestão é simples: se não tiver certeza do processo, não faça composto mal feito. Jogue o esterco, jogue a palha de café, mas evite arriscar um composto de qualidade duvidosa. Por quê? Porque além de perder tempo e dinheiro, você pode acabar produzindo um fermentado tóxico, que prejudica a planta, o solo e todo o sistema. Nesse caso, é melhor aplicar o esterco e a palha diretamente, sem inventar algo que vai causar problemas.

Se a ideia é aproveitar melhor o resíduo, podemos ir por etapas. Primeiro, usar esterco. Depois, avançar para outros materiais como cama de vaca, de boi ou de frango, que já são formas de compostagem espontânea, mais seguras e um pouco mais eficientes. A torta de filtro também é uma opção. Agora, se a intenção é fazer um composto de alta qualidade, aí é preciso buscar conhecimento técnico ou contratar empresas especializadas para produzir um material adequado, sem riscos para a lavoura.

Mas há um detalhe importante que muita gente não percebe: o composto convencional produzido nesses processos longos (90 a 120 dias) sofre grande perda de massa. Entram 100 toneladas de material bruto e saem cerca de 45 toneladas de composto pronto. Isso significa que você perde mais da metade do material inicial durante o processo. E se considerarmos o custo dos insumos – R$200 a tonelada de esterco, R$250 de frango, R$100 de cana, R$400 de serragem, R$150 de outros resíduos – a perda se transforma em prejuízo.

Por isso, antes de entrar nessa produção de composto sem o devido conhecimento, o melhor é focar em práticas simples e seguras, evitando desperdício de recursos e riscos para a lavoura.

Faz sentido, e aí depois, para complicar ainda mais, quando a gente tenta avaliar a qualidade do composto, normalmente olha apenas o quanto de NPK ele tem. Aí você manda analisar e recebe um resultado de 2, 2, 2. Esse é o percentual em relação à massa final, que já sofreu grande perda, por isso parece mais concentrado. A matéria verde foi embora, a leira que começou cheia agora está bem menor. Esse é um dos problemas da compostagem convencional: a enorme perda de material.

Mas existe outro problema ainda maior, e foi aí que surgiu a grande sacada que levou à criação da compostagem tropical. Eu acredito que essa ideia veio de uma intuição muito feliz que tive um dia. Eu fazia compostagem do jeito que aprendi na escola, seguindo todos os manuais. Até que um dia, lá em Altinópolis, onde estou há 16 anos trabalhando com a Fazenda Fortaleza, me deparei com uma situação que me fez repensar tudo.

Cheguei em um produtor que fazia cerca de 5 mil toneladas de composto por ano. Ele me mostrou uma leira e disse: “Essa aqui já está pronta”. Perguntei como ele tinha certeza disso, e ele respondeu: “Não esquenta mais. Já molhei, já bati com o compostador, e a temperatura não sobe mais que 28 graus”. Só que uma leira saudável deveria passar dos 60 graus. Aquele material já tinha mais de 100 dias, era uma mistura de casca de café, palha de café, um pouco de serragem, bagaço de mamão, de confinamento bovino, resíduos de cacau ensilado... E mesmo assim, nada de calor. Para ele, estava pronto, maturado, curado.

Na época, lembrei das aulas da escola e percebi que algo estava errado. A compostagem convencional não funcionava bem para o nosso clima tropical. A perda era enorme, o processo demorava demais e, no final, entregava um composto pobre, sem vida, sem eficiência real para a lavoura. Foi a partir daí que comecei a buscar alternativas e acabamos desenvolvendo a ideia da compostagem tropical, que mudou completamente a forma de aproveitar resíduos orgânicos na agricultura.

Aí eu falei para mim mesmo: “Está pronto mesmo”. Voltei para o carro, fui embora meio pensativo e fiquei refletindo no caminho. Aquela leira tinha cerca de 500 metros de comprimento, 4 metros de largura, 1,5 metro de altura. Ali devia ter umas 150 toneladas de material que, dias atrás, estava fervendo a 65, 70 graus, e agora tinha esfriado. Parei para pensar: quanta energia seria necessária para pegar 150 toneladas de qualquer coisa e elevar a 70 graus? De onde vinha toda essa energia?

A resposta era simples: o calor vinha da atividade dos microorganismos, que estavam ali dentro, vivos, se alimentando do material orgânico. Era a vida trabalhando, comendo e transformando aquele material. Mas por que tinha esfriado? Porque não havia mais o que comer. A leira ficou sem alimento para os microorganismos. E eu, que queria fazer um composto para alimentar a vida do solo, na verdade estava produzindo algo que já não tinha mais nada para oferecer, apenas minerais residuais, como se fosse um adubo químico.

Foi aí que caiu a ficha e quebrei um paradigma importante. O composto orgânico que realmente dá resultado não é apenas um concentrado de nutrientes. Ele precisa ser um pré e um probiótico para o solo. Eu tomo emprestado esse termo da medicina, porque na agronomia não existe nada parecido. O pré-biótico, no nosso corpo, é um alimento para a microbiota, para as bactérias boas que vivem dentro da gente. No solo é a mesma coisa: um bom composto é comida para os microorganismos, é energia para a vida do solo continuar ativa. É por isso que a leira esquenta: porque tem vida comendo lá dentro. E quando ela esfria, é porque acabou a comida.

Parou de esquentar porque não tinha mais comida para os microorganismos. E aí entra a outra parte: o probiótico. Probiótico são os próprios microorganismos. O que eu quero fazer na leira de compostagem é um pré e um probiótico ao mesmo tempo: eu quero produzir comida para eles e, ao mesmo tempo, multiplicar fungos e bactérias para dar um reforço populacional lá no talhão de café, quando esse composto for aplicado.

É curioso ver como tem gente que paga R$ 400,00 num vidrinho ou num saquinho que contém apenas um tricoderma ou um bacilo específico, e não valoriza toneladas dos mesmos microorganismos presentes em um composto bem feito. Hoje, a análise metagenômica consegue provar que esses organismos estão lá dentro, em quantidade e diversidade muito maiores do que nesses produtos comerciais. Enquanto se paga caro por um litro ou um quilo desses bioinsumos aplicados por hectare, o composto, que é jogado em cinco, seis, até dez toneladas por hectare, está repleto de vida, carregado desses “bichinhos” que sustentam o solo.

E o valor real do composto não está no NPK que ele contém. A quantidade de NPK por tonelada não passa de R$ 250,00. Mas o que existe ali em microorganismos, ácidos húmicos, aminoácidos e alimento para a microbiota do solo vale mais de R$ 2.000,00. Por isso, não adianta avaliar um composto apenas pela análise química, olhando o percentual de nitrogênio, fósforo ou potássio. O que realmente importa é como a fermentação foi feita, porque é isso que vai determinar se ele vai, de fato, alimentar a vida do solo e fazer diferença na lavoura.

O que tem aí dentro de microorganismos? Tem ácido húmico? Ah, não sei... Mas se nem quem produziu sabe, fica difícil acreditar que vai fazer diferença no solo, não é? É por isso que surgiu o conceito da Compostagem Tropical – o top do top quando o assunto é adubação orgânica de qualidade.

Na compostagem convencional, você começa com 100 toneladas de material e, depois de 90 a 120 dias, termina com 45 toneladas. Mais da metade do que foi comprado vai embora em perda de matéria orgânica e nutrientes. Já na compostagem tropical, o processo é muito mais eficiente: em cerca de 40 dias, 100 toneladas viram 80 ou 85. Você perde muito menos do material investido porque o objetivo não é deixar tudo virar pó, é apenas “cozinhar o feijão” para alimentar os microorganismos por muito tempo.

O solo é vivo, e os microorganismos funcionam como a gente: eles gostam de comida de verdade, nutritiva e duradoura. A compostagem tropical preserva a “carne” do alimento, a parte mais rica em nutrientes e energia, em vez de deixar tudo virar carvão ou pó inerte. Por isso, ela é diferente de um simples esterco envelhecido ou de um composto convencional.

A definição técnica pode parecer chata, mas é simples: a compostagem tropical é um processo rápido, controlado, com fermentação aeróbica de qualidade superior, que mantém a maior parte da biomassa e concentra o que realmente interessa para o solo – energia e vida para a microbiota que sustenta a fertilidade da lavoura.

Muita gente aprendeu – e eu também aprendi assim – que o esterco curtido é melhor que o fresco para fazer composto. Mas, para a compostagem tropical, é o contrário: o esterco verde é melhor que o curtido. O mesmo vale para os outros materiais: o bagaço de cana novo é melhor que o velho, a palha de café recém-saída do terreiro é muito mais rica do que aquela guardada por dois anos no pasto, molhada de chuva, fermentada ou até queimada pelo sol. Aquilo que já “virou caldo preto” perdeu grande parte do que poderia alimentar a vida do solo.

Se a ideia é fazer uma compostagem tropical de qualidade, o material precisa ser fresco, cheio de energia e nutrientes para os microrganismos. Claro, dá para guardar a palha para o próximo ano, mas é preciso proteger bem da chuva para não perder qualidade. Caso contrário, na hora de fazer o composto, o resultado será bem mais pobre.

O processo também segue um protocolo técnico: a relação carbono-nitrogênio precisa estar equilibrada, a leira precisa ser bem montada, e a temperatura deve se manter acima de 60 °C por um tempo suficiente. Isso garante não só a decomposição eficiente, mas também a eliminação de sementes de plantas invasoras, nematoides e patógenos que possam estar no material. Assim, quando o composto volta para o solo, ele é um aliado, não um problema futuro.

A regra é simples: quanto mais fresco e bem manejado o material, mais nutritivo e seguro será o composto tropical, alimentando a microbiota do solo e devolvendo vida à lavoura.

Quando a leira mantém mais de 12 dias a uma temperatura acima de 60 °C, praticamente todas as sementes de plantas invasoras, nematoides e patógenos presentes são eliminados. Há laudos de campo comprovando isso. No entanto, existe um limite: não se pode deixar passar de 70 °C, pois, acima disso, a vida microbiana benéfica começa a morrer. A própria palha de café, por exemplo, se carboniza a 75 °C, perdendo o valor nutritivo e se transformando quase em carvão.

Por isso, o controle diário da leira é fundamental. É necessário medir a temperatura todos os dias, observar a liberação de gases e até o cheiro que a leira exala, pois isso indica o que está acontecendo dentro dela. Um odor forte de amônia, por exemplo, mostra que o processo está desbalanceado e precisa de correção, geralmente ajustando a umidade.

Atualmente, já existem aplicativos de celular desenvolvidos para facilitar esse monitoramento, garantindo uma fermentação controlada e de alta qualidade. Quando o composto atinge o ponto ideal, é preciso decidir: vai ser aplicado logo ou será armazenado para uso futuro?

Se for guardar, o processo precisa ser paralisado corretamente, retirando a umidade da leira para interromper a atividade microbiana. Caso contrário, ela continua fermentando, perde nutrientes e, quando chegar a época da aplicação, grande parte da qualidade terá se perdido. Esse cuidado é o que garante que a compostagem tropical entregue um material vivo, nutritivo e eficiente para o solo.

A grande sacada que eu tive foi perceber que o verdadeiro valor da compostagem tropical está em alimentar os micro-organismos e multiplicá-los, criando um sistema vivo para o solo. O NPK presente no composto, claro, será aproveitado, mas a questão é: ele tem o mesmo valor que o NPK do adubo químico? Ou até maior?

Quando um vendedor oferece um fertilizante de liberação controlada, ele argumenta que o produto é mais eficiente porque o nutriente é protegido, liberado aos poucos e evita perdas. O mesmo raciocínio se aplica ao organomineral, que combina nutrientes com matéria orgânica, garantindo melhor retenção e aproveitamento pelas plantas, com menor lixiviação e volatilização.

Então, se isso é verdade para esses fertilizantes industrializados, por que não considerar o mesmo princípio na compostagem tropical? Os minerais presentes na leira passam pelo processo biológico, ficam complexados na matéria orgânica, mais estáveis e disponíveis para a planta por mais tempo. Além disso, o fósforo, que costuma ter alta fixação no solo, tem muito menos perda quando está associado à matéria orgânica do composto, resultando em maior eficiência.

Ou seja, a compostagem tropical não só fornece nutrientes, mas entrega nutrientes inteligentes, protegidos biologicamente, além de bilhões de micro-organismos e moléculas bioativas que nenhum saco de adubo químico consegue oferecer sozinho.

Existe hoje um índice de eficiência agronômica que demonstra que o uso de um composto tropical bem feito pode permitir uma redução drástica na adubação química com grão, desde que o processo seja conduzido corretamente. Não adianta apenas afirmar que o composto tem qualidade: é preciso ter laudos e parâmetros técnicos que comprovem seu potencial agronômico.

Para ilustrar melhor, o processo de compostagem tropical apresenta perdas muito menores do que a compostagem convencional, garantindo maior aproveitamento do material aplicado. Atualmente, trabalhamos em parceria com a empresa Andris e o professor Fernando Andreotti, um dos maiores especialistas brasileiros em microbiologia do solo, para criar uma base de dados robusta voltada exclusivamente para compostagem orgânica de qualidade.

Esse trabalho resultou no desenvolvimento de laudos específicos para compostagem, já que, até pouco tempo atrás, só existiam análises químicas tradicionais. Hoje, além dos teores de NPK, conseguimos avaliar parâmetros biológicos fundamentais, como:

Carbono orgânico presente no composto;

Ácidos húmicos (ex.: 21 kg por tonelada);

Ácidos fúlvicos (ex.: 11 kg por tonelada);

Ausência de coliformes – um indicador eficiente e econômico que substitui a análise individual de cada patógeno fitossanitário (como fusário, mofo branco, escleródios, entre outros);

Ausência de nematoides e sementes de plantas invasoras, garantindo que o composto não leve novos problemas para o campo.

Com esses dados, fica comprovado que o composto tropical não é apenas um adubo orgânico, mas um bioinsumo vivo, seguro e altamente eficiente, capaz de potencializar o desenvolvimento da planta, reduzir custos com fertilizantes minerais e melhorar a saúde do solo a longo prazo.

No processo de validação da qualidade do composto tropical, um dos passos importantes é garantir que ele seja seguro para aplicação no campo, sem riscos de intoxicar a planta ou introduzir novos problemas. Para isso, utilizamos diferentes tipos de análises biológicas e enzimáticas.

Uma delas é o teste de germinação com plantas indicadoras, como sementes de alface ou agrião. Se essas sementes germinam normalmente, mesmo em contato direto com doses elevadas do composto, isso é um indicativo de que o produto não apresenta fitotoxicidade. Caso contrário, se houvesse presença de compostos tóxicos ou mal decompostos, essas sementes não germinariam ou apresentariam anomalias, alertando para risco de amarelamento ou dano nas folhas do café.

Além disso, realizamos análises enzimáticas, como a atividade da fosfatase, uma enzima que indica a capacidade do solo de solubilizar fósforo naturalmente. Esse parâmetro é importante para avaliar a qualidade microbiológica do composto. No início, não existiam valores de referência para interpretar esses números. Por exemplo, um resultado de 550 U/kg não tinha significado prático – não sabíamos se era bom ou ruim.

Com o tempo, construímos um banco de dados robusto, hoje com mais de 1.500 análises de compostos tropicais, permitindo estabelecer valores médios de qualidade para mais de 30 indicadores biológicos e químicos. Assim, conseguimos comparar cada lote produzido com essa base de referência e determinar se ele está acima, dentro ou abaixo da média, garantindo maior precisão na recomendação de uso.

Isso torna a compostagem tropical um sistema tecnicamente validado e seguro, unindo eficiência agronômica, riqueza microbiológica e confiabilidade para aplicação em lavouras de café e outras culturas.

Alguns produtores têm utilizado maravalha de eucalipto como parte da mistura para a compostagem, especialmente quando precisam corrigir o excesso de esterco ou reduzir a temperatura das leiras. A maravalha funciona como uma fonte rica de carbono, elemento essencial para equilibrar a relação carbono/nitrogênio durante o processo.

Quando o produtor apenas mistura esterco e fósforo, sem adicionar carbono suficiente, o resultado não é uma compostagem verdadeira, mas sim um “organo-mineral”. Para a fermentação funcionar corretamente, é indispensável oferecer alimento equilibrado para os micro-organismos: matéria orgânica fresca, rica em carbono, para que eles possam consumir e multiplicar, transformando a mistura em um composto de qualidade.

Além do equilíbrio de nutrientes, a organização do pátio de compostagem é fundamental. Uma leira bem-feita não gera mau cheiro, não atrai moscas, não forma aquela crosta preta de decomposição anaeróbica e pode até ser construída próxima à sede da fazenda sem causar incômodos. Assim como uma boa silagem tem cheiro agradável e aparência saudável, a compostagem bem conduzida é limpa, controlada e segura.

Para produtores de pequeno porte, que não dispõem de maquinário para movimentar grandes volumes, existem técnicas adaptadas. A Escola de Sustentabilidade e Agricultura do Café (ESAG) oferece receitas ajustadas ao tamanho da propriedade, permitindo fazer a compostagem manualmente, com enxada ou pequenas ferramentas, garantindo que mesmo em escala reduzida o processo atinja o padrão correto de qualidade.

Tudo isso reforça que compostagem de verdade é ciência e manejo técnico, não apenas “jogar esterco na leira”. Quando há equilíbrio, controle de umidade, temperatura e nutrientes, o resultado é um produto rico, cheio de vida e capaz de transformar a fertilidade do solo.

A aplicação correta da água é um dos pontos mais importantes para garantir a qualidade do composto. Ela não pode ser feita de qualquer jeito, apenas “por cima” da leira. O ideal é injetar a água diretamente na crista, no sulco central da leira, garantindo que a umidade penetre de forma uniforme por dentro da massa. Molhar só por fora faz com que boa parte da água escorra ou evapore rapidamente, sem atingir o núcleo onde ocorre a fermentação microbiana.

Outro detalhe essencial é o momento certo de molhar e bater a leira. Se a água é aplicada hoje e a movimentação só acontece no dia seguinte, até metade da umidade pode ser perdida para o vento e para o sol. A recomendação é molhar e revolver imediatamente, incorporando a água na massa orgânica para manter a umidade estável em torno de 50%, favorecendo a atividade dos micro-organismos.

O uso de chorume também pode ser uma alternativa para a umidificação, desde que haja controle da dosagem e do momento de aplicação, evitando excesso de nutrientes ou fermentação desbalanceada.

A organização do processo faz toda a diferença. Em sistemas mecanizados, um trator puxa a compostadora enquanto outro realiza a irrigação direcionada, garantindo eficiência no uso da água e homogeneidade do composto. Cada leira é monitorada diariamente por meio de um aplicativo, onde o funcionário registra dados como temperatura, volatilização de gases e umidade, permitindo ajustes rápidos e precisos.

Assim, a compostagem deixa de ser um processo empírico e passa a ser um manejo técnico, padronizado e rastreável, onde nada é feito “no olho”, evitando desperdícios e garantindo um produto final com alta qualidade biológica e nutricional.

Cada leira é um investimento alto e deve ser tratada como se estivesse dentro de uma fábrica de fertilizantes, com controle rigoroso de cada etapa. Uma única leira de 100 metros, dependendo do tamanho da compostadora, pode conter mais de 100 toneladas de adubo orgânico em processo de fermentação, exigindo manejo criterioso e sem improvisos.

Existem casos de propriedades onde o espaço é limitado, como em uma fazenda em São Sebastião do Paraíso, onde só havia área para uma única leira. A solução foi montar uma leira de 1 quilômetro de extensão, visível até da estrada, demonstrando que o importante não é a quantidade de leiras, mas sim a qualidade do processo. Para isso, a compostadora operou a uma velocidade controlada, inferior a 300 metros por hora, permitindo que a aeração e a mistura fossem feitas corretamente, mesmo que o tratorista precisasse de quatro horas para percorrer todo o trajeto.

Infelizmente, ainda é comum encontrar produtores que avaliam a qualidade do composto “no tato”, colocando a mão na leira para sentir a temperatura. Esse método é totalmente ultrapassado. Hoje existem termômetros digitais acessíveis e precisos, que eliminam a necessidade de adivinhações, garantindo um controle profissional da fermentação.

A compostagem moderna exige organização, tecnologia e disciplina, com monitoramento de temperatura, umidade e gases diariamente. É esse cuidado que garante um adubo de alto padrão, sem perdas desnecessárias e com eficiência agronômica superior.

Em algumas propriedades ainda persistem práticas antigas e pouco seguras para verificar a temperatura da leira, como “colocar o ferro na testa ou a mão no composto”. Isso é folclórico e totalmente ultrapassado. Atualmente, qualquer produtor pode adquirir um termômetro de culinária simples, por cerca de 30 reais, adaptá-lo com um cabo (até mesmo usando uma enxadinha para alcançar o centro da leira) e obter uma leitura precisa da temperatura, sem riscos e sem improvisos.

Outro erro comum é a regulagem incorreta da compostadora. Muitas vezes, ao entregar a máquina, o técnico ajusta o rolo de facas mais alto para evitar sobrecarga no equipamento. Só que isso compromete o processo: se a roda da máquina não trabalha rente ao chão e a leira fica mal formada, cerca de 30% do material não é revolvido adequadamente, resultando em compostagem irregular. O produtor mistura depois tudo sem perceber, mas parte do material não atinge a fermentação aeróbica ideal, diminuindo a qualidade final do composto.

O ideal é trabalhar em um terreiro bem nivelado, com leiras formadas corretamente, permitindo que a compostadora atinja a profundidade certa. Em alguns casos, dependendo do tipo de material, pode ser necessário ajustar a máquina para bater um pouco mais alto, desde que o trator tenha força para manter a rotação adequada. Esses detalhes práticos são fundamentais para garantir que 100% da massa receba oxigenação e umidade uniformes, evitando pontos de fermentação ruim.

Uma leira mal formada ou excessivamente alta, como as de 4 metros vistas em algumas propriedades, não é sinônimo de eficiência. O que define um bom composto não é a quantidade, mas sim o manejo técnico, a padronização e o controle diário de todas as variáveis do processo.

Quando a leira é formada alta demais, o próprio peso do material compacta as camadas inferiores, reduzindo a aeração e criando zonas de fermentação anaeróbica, onde o processo se torna ineficiente e até prejudicial. Nessas partes, o material pode ficar encharcado, com odor forte, textura pegajosa e perda de qualidade, pois não ocorre a decomposição aeróbica adequada. Por isso, existe uma altura ideal de leira, que não deve ultrapassar o limite recomendado pelos técnicos e pela capacidade da compostadora.

Um caso prático foi o de um produtor vizinho que, ao tentar copiar a receita de outro sem seguir o manejo correto, montou leiras muito altas e sem o devido controle de temperatura. O resultado foi um composto cheio de sementes viáveis de plantas invasoras, como a corda-de-viola, que germinaram posteriormente na lavoura. Isso aconteceu porque ele não manteve pelo menos 12 dias consecutivos acima de 60 °C, temperatura mínima necessária para eliminar sementes e fitopatógenos presentes no material.

Por isso, não basta ter a fórmula ou os insumos certos, é fundamental respeitar o protocolo técnico, garantindo revolvimento adequado, altura correta das leiras, umidade, aeração e temperatura controlada diariamente. Hoje já existem protocolos padronizados, inclusive para períodos de chuva, que permitem compostar com segurança, mesmo em sistemas maiores com produção de resíduos constantes, como em propriedades com gado leiteiro, sem riscos de falhas ou contaminação do material final.

Em propriedades com sistemas de produção intensivos, como o freestyle ou áreas industriais, ainda é comum ver um problema grave: a falta de conscientização sobre o manejo correto dos resíduos orgânicos. Muitas vezes, materiais como garrafas plásticas, seringas usadas, embalagens de sal e outros itens contaminantes são descartados junto ao esterco, porque a equipe da fazenda ainda enxerga aquilo como “lixo” e não como um recurso valioso para a produção de adubo orgânico de alta qualidade.

Por isso, um dos primeiros passos para estruturar um pátio de compostagem eficiente é realizar um trabalho de educação e conscientização com os colaboradores. É essencial mostrar que aquele esterco é um insumo agrícola, e que qualquer resíduo estranho pode comprometer todo o processo, além de oferecer riscos sanitários. A instalação de coletores adequados e sinalizados para resíduos não orgânicos ajuda a manter a limpeza e a qualidade do material.

Infelizmente, ainda se encontram pátios que mais se parecem com lixões, sem qualquer organização, com resíduos espalhados, presença de urubus, moscas e mau cheiro. Isso compromete a sanidade do composto, a eficiência do processo e a imagem do próprio produtor. Compostagem não é depósito de lixo, é um processo técnico que exige cuidado, higiene e manejo correto.

Além disso, mesmo um composto de boa qualidade não supre todo o nitrogênio necessário para a lavoura. É preciso pensar na complementação nutricional, e há décadas já se utilizam técnicas de complexação da ureia na fazenda, utilizando soluções à base de ácidos húmicos, que aumentam a eficiência do fertilizante, reduzem perdas por volatilização e potencializam o efeito conjunto do composto orgânico com a adubação mineral complementar.

No manejo do solo, a complexação da ureia associada ao uso de ácidos húmicos permite uma economia de até 50% na aplicação de nitrogênio, garantindo maior eficiência no aproveitamento do nutriente pela planta. Essa prática pode ser feita na própria fazenda, utilizando soluções simples ou equipamentos específicos, reduzindo custos e perdas por volatilização.

Além do manejo nutricional, é fundamental entender que produtividade não pode vir às custas da degradação do solo. A chamada contabilidade ambiental do solo é uma ferramenta que avalia, de forma objetiva, se a atividade agrícola está contribuindo para a regeneração ou para o esgotamento do solo. A análise é feita com base em indicadores físicos, químicos e biológicos, georreferenciados ao longo do tempo, permitindo um diagnóstico claro da evolução da qualidade do solo.

Quando os resultados mostram que a propriedade está melhorando a fertilidade e a saúde do solo, o produtor pode receber um selo de contabilidade ambiental positiva, um diferencial que já vem sendo utilizado por produtores de café especial e até em outros produtos, como cachaça, para agregar valor e destacar práticas regenerativas no mercado. Esse selo demonstra ao consumidor que aquele produto não apenas foi produzido com qualidade, mas também contribuiu para a restauração e preservação do solo, deixando um legado positivo para as próximas gerações.

Nós contamos com uma escola voltada para o manejo regenerativo do café, aberta a produtores que desejam aprimorar suas práticas e alcançar melhores resultados no campo. Essa escola é formada por um corpo voluntário altamente qualificado, composto por oito profissionais de referência no setor. Entre eles, está Zé Mário Jorge, um dos maiores consultores de café do Brasil, com forte atuação na Alta Mogiana; a equipe da Brazil, especialista em controle biológico para sistemas agrícolas; Gabriel, da CONAG, responsável por orientar os produtores sobre contabilidade e administração para pequenas propriedades; Thiago Broleto, da Libertas, especialista em compostagem e manejo de resíduos orgânicos; Dr. Afonso Peixe, do IAC de Campinas, referência em fertilidade e manejo de solos; Paulo Ardornich, especialista em microbiologia do solo; Madeleine Versch, com expertise em gestão agrícola; e o professor Antoni, que contribui com conhecimento técnico e direcionamento estratégico. A proposta da escola é oferecer um espaço de aprendizado prático e acessível, permitindo que os produtores compreendam desde a nutrição equilibrada do café e o manejo biológico até a gestão financeira da propriedade e a produção de compostos de qualidade. Ao final das apresentações, os participantes têm a oportunidade de esclarecer dúvidas, como no caso do questionamento sobre o uso do pó de rocha, quando são explicados os tipos mais recomendados, levando em conta análises de solo, necessidades da lavoura e potencial de liberação de nutrientes, sempre com base em dados técnicos e experiências validadas no campo.

 

 

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